sexta-feira, janeiro 15, 2010

de novo

[em casa sozinha, ouvindo Leonard Cohen, fazendo arroz empapado e lendo textos antigos. Tive vontade de repostar esse, sem a frase final, que agora, quase 4 anos depois, eu percebi como era inútil.]

Pablo - Cora


Acho até que aprendi a gostar desse barulho indefinível e humano que fazem as pessoas quando são muitas, dadas as tantas vezes em que ele me foi companhia enquanto eu esperava Pablo apontar de algum canto, atrasado como sempre, e já sei que ela fará aquele bico com os lábios, aquele que um dia cheguei até a achar engraçadinho e que hoje só me faz questionar porque ainda levo isso a frente.

-‘Sinceramente não sei.’, eu digo e retorço os lábios pra que ele perceba que me cansa estar sempre por sua conta, pra que ele entenda que tanto me faz o que jantaremos e prá que ele, se for isso aqui menos bobo, atine para o fato de que, por deus, não fica bem com essa camisa gola pólo eu até vesti pra não ter de ler nos olhos de Cora a censura muda que por vezes ela faz de minhas roupas.

Mas já não há jeito de agrada-la e a noite será de poucas palavras depois e o garçom chega para receber nossos pedidos. Ele erra a pronúncia do francês ao pedir o prato, como sempre, e eu disfarço o constrangimento com um sorriso falho, que só faz, na verdade, traduzir a pena que sinto pela sua burrice, burrice! e eu me castigo internamente por não ter dado a ela atenção quando tentava-me ensinar, ainda em tom de brincadeira, a pronúncia daqueles “ôs”, “ês” “tré´s” que, da boca dela fluíam tão naturalmente e me embaraçavam todo esse silêncio entre nós dois... eu tento lembrar quando é que foi que se instalou com essa força, como se nunca tivesse sido cortado por palavras. Tento me lembrar quando foi que parei de ver nos erros de Pablo a graça de sua imaturidade.

Ele me parece agora ter deixado só o corpo por estas bandas, pois não me mira os olhos enquanto me pergunta “Como foi o dia?” e as palavras pulam automáticas de minha boca, na tentativa já fracassada de puxar algum assunto e mandar pra longe da mesa essa sensação de que só estamos aqui, travando este combate surdo contra nossas reais vontades, porque, como namorados, isto não seria mais que nossa obrigação.

Cora me diz que “foi bom, e o teu?” é o máximo que consigo responder, afundando-me no ridículo da trivialidade, e antecipando aquele silêncio instalar-se entre nós outra vez, e apontar que já não temos mais o que dizer um para o outro, e eu sinto-me entristecer por perceber que, assim como Cora já não me é necessária, para ela eu também não o sou.

O garçom trás o nosso jantar e comemos, tão maquinalmente como, horas depois, ela sente o meu peso sobre seu corpo já me é tão indiferente que tenho vontade de que ele acabe logo para que eu vire-me pro meu lado da cama e finja dormir, as frases amargas que eu nunca direi a Pablo querendo-me saltar à boca fechada, eu não falarei a Cora sobre o nosso fim, que não há porque mostrar a ela aquilo que qualquer um vê.