sábado, dezembro 23, 2006

Como não podia deixar de ser.

Talvez piores que os hábitos realmente difíceis de se perder sejam os hábitos que não se quer perder, mas que, com o passar do tempo, parecem não ter mais propósito.

Hum. Faz um pouco de sentido, mas não o tanto necessário prá ilustrar o egocentrismo que segue, calcado na desculpa de quase tradição - e podem existir tradições nascidas há menos de cinco anos? Talvez seja uma questão proporcional. Enfim.
O tal post e fim de ano: comentário ridiculamente auto-avaliativo sobre as coisas que me foram durante o ano que passou.
Dessa vez eu bem podia fazer comparações simplistas e dizer que eu percebi que quanto mais entro nas letras menos contato prático eu tenho com elas; que quanto mais o tempo passa menos eu tenho a necessidade de me levar a sério; que aprender a lidar com distância não é, assim, algo tão terrível; entre tantas outras coisas que agora eu consigo ver através da névoa de todos os dias que ficaram em 2006.

Mas, ouvindo uma das minhas músicas mais bonitas entre tantas outras, e sentindo uma saudade que chega a me dar raiva [eu, que sempre pensei que saudade matava mansa e aos poucos, nunca a imaginei assim, nervosa e convulsa como ela me é agora.], vou repetir um garoto e uns garotos, prá dizer que, sobre o ano que termina, as coisas podem ser resumidas de um jeito simples: "All you need is love."


Prá vocês, um 2007 feito de abraços de verdade, sorrisos e crises de riso, ressacas que valham a pena, desconstrução de velhos conceitos [achei pedante, hein?] e construção de outros, também tão prestes a serem destruídos.
E comam muito e tenham um natal feliz. :)


[Eu volto por aqui em Janeiro, mais nêga e menos brega, quem sabe.]

segunda-feira, dezembro 04, 2006

...prá que rimar amor e dor?

Talvez porque, salvo o caso de você ser um Cortázar, só a tônica do amor não presta, não desenvolve.
Se você escreve prá dar cabo na inquietação que fica após aquele filme que depois de alguns anos ficou tão melhor, se as frases não te tomam prisioneiro e te colocam maluco até que paridas num papel [elas vêm mesmo é na passagem da sala pro quarto; nos olhos que não se fecham só prá dormir; numa inútil abrida de geladeira - e vêm cruas e descabidas como os próprios atos que as fomentam, sem pretensão de se tornarem um dia concisas e bonitas como uma birosca.], se não te sobra intimidade com as letras prá fazer de coisa como amor e só amor algo bonito sem ser piegas, a minha receita é simples:
Daquele senhor, cujas rugas já são tão fundas que parecem dizer de todos os gestos por ele já feitos, ao mesmo tempo em que anunciam os movimentos futuros, cate a dor duma perda imaginária, talvez inexistente. Da moça que caminha displicente, como se ser bonita daquele jeito fosse coisa normal, procure a dor que ela plantou em todos aqueles que presenciaram um 'não' sair dançando de sua boca prá pousar cortante em ouvidos infelizes. E se você não tiver caráter nenhum, vale até catar as desilusões de jardim-de-infância do garotinho que volta cabisbaixo prá casa, as duas paçoquinhas na mão - uma por ela rejeitada, e a outra que ele já não quis depois que o apetite foi dar uma volta.
Desligue Caetano quando ele vier indagar o porque da sua rima, junte as dores alheias com alguma que você já deve ter tido, caia no óbvio, mas mate - não definitivo, óbvio - aquela inquietação que sabe-se lá porque te surgiu.


[O trabalho do Fernando Pessoa não me fez bem, mesmo.]

terça-feira, novembro 21, 2006

prá lembrar.

Depois de sentir na cabeça dolorida e no corpo cansado o resultado da minha - sempre - procrastinação, eu me lembrei daquele tempo em que isso aqui ainda era tão meu que eu quase que nem pensava duas vezes prá escrever qualquer coisa.
Não sei se foi o meu próprio alheiamento de mim mesma, ou se foi o olhar que começaram a lançar pros cantos de cá. Sei que hoje em dia ainda há receio.
Mas, prá lembrar de quando eu ainda tinha coragem de dizer com as minhas músicas [algumas tantas que hoje em dia já nem me agradam. é estranho isso de o tempo passar, né?], e prá esquecer do tanto de coisas que eu tenho que fazer nesse fim de semestre.

All is full of love
Björk


"You'll be given love,
You'll be taken care of.
You'll be given love,
You have to trust it.

Maybe not from the sources
You have poured yours.
Maybe not from the directions
You are staring at...

Twist your head around:
It's all around you.
All is full of love,
All around you.

All is full of love,
[You just aint receiving.]
All is full of love,
[Your phone is off the hook.]
All is full of love,
[Your doors are all shut.]
All is full of love!
All is full of love, all is full of love...
All is full of love, all is full of love..."


[É lindo. E tem vídeo! ;)]

segunda-feira, novembro 13, 2006

Você [não] precisa saber de mim...

...mas eu sou egocêntrica o bastante prá querer te contar.
Dos dias que ficaram prá trás, e que ás vezes me parecem ser tantos e terem se perdido há tanto tempo, que me esmagam de um jeito que eu nem saberia explicar. [E me esmagam pelo simples fato de já terem se ido, e de parecerem, mesmo assim, congelados nos lugares pelos quais eu passei. Dias que servem agora de cenário para outras marionetes dançarem. (Já se sabe, há tanto tempo!, que ninguém nunca é tireteiro de si próprio).]
De tudo que eu já vi e nunca mais verei, devido ao simples fato de que as coisas não se deixam ser duas vezes. [Por exemplo a lataria azul-forte do ônibus, que, mais ou menos molhada de chuva, me contava que eu podia descobrir a felicidade bem ali, naquele achar bonito algo que antes me fora tão banal.]
E das coisas que ainda virão; as coisas que eu tento desenhar de acordo com as cores da minha vontade; aquelas coisas e situações que eu crio prá mim e que eu não posso, não devo e não quero deixar escorrerem das minhas mãos, ainda que eu não vá nunca poder apalpá-las.


[Uma besteira dessas vez ou outra, uma tentativa dum escrever mascaradamente feliz, que agora eu sou boba, agora eu posso. E você precisa aprender o que eu sei, e o que eu não sei mais.
Boa noite, eu não vou fazer o trabalho que tinha prá hoje não. :)]


Ouvir aquela canção do "Roberto"...

quinta-feira, outubro 26, 2006

esse mesmo.

Quando o dia já ia querendo se acabar, e punha violeta no céu como se dissesse "até" com todo aquele arrombo pros olhos, eu me lembro de vê-lo chegar vagaroso até o quintal de sua casa, e, com seus passinhos trêmulos de quem sente a morte roçar as orelhas, entrar na pequena piscina. Indo prá lá e prá cá com uma paz que, talvez no mundo todo só nós dois entenderíamos àquela hora, ele findava seu dia e inaugurava meu sorriso doído, aquele que a gente guarda prá quando das coisas que, de tão singelas, chegam a machucar.
Não calculo bem o dia exaato em que eu me pus no parapeito da janela e, ao olhar prá baixo, na tentativa furtiva de me acalmar de todo um dia vivido, deparei-me apenas com o azul-sem-graça dos azulejos tremulando bobos na água; alguns meio manchados de lodo e sujos, como todo o resto do quintal.

Teria o tempo se adiantado sem que eu me desse conta, ou será que se morre mesmo é assim, num instante só, sem que a gente que fica pelo menos desconfie do que vai acontecer?
Nem o tempo nem o senhor deram-me pista de quão imersa eu estava nas pequenas [e por vezes medíocres] preocupações que constroem uma vida [por vezes pequena, por vezes medíocre]. Prá mim eles só deixaram o estranhamento do azul-piscina imóvel, e o desconforto desses fins de tarde, agora tão menos pacíficos.


[- Porque o amor das coisas no seu
tempo futuro
é terrivelmente profundo, é suave,
devastador.]

Herberto Helder.

quinta-feira, outubro 19, 2006

puêrá, á á...

[O dia já se borrou de rosa fresco várias vezes, mas as mãos continuam tremendo, talvez prá compensar a quietude na qual se meteram as idéias.
Contudo há as antigas, sempre, cheias daqueles pontos e palavras que, quando não matam de vergonha, matam de saudade.
De uns dois, três meses atrás, então, ainda em Diamantina, depois dum pouquinho de Bossa Nova - e os ouvidos grudados especialmente nessa.]


Um corpo que oscila entre radiante talhado dilacerado febril apaixonado e apaixonado e apaixonado.
Um corpo nunca completo, a clamar a todo o tempo pelo corpo de outro; corpo do outro.
E, ainda que satisfeito na fugacidade d´alguns instantes, não se permite o sossego: faz de canto a purgação da felicidade, da sensação de que "tudo se fez o que tinha de ser".
Corpo que antevê as cicatrizes e mesmo assim se põe a elas entregue. Na dificuldade da esquiva não quista é impotente, frágil, nunca senhor de si.
Sobretudo é corpo que não se acaba em si mesmo ? Leva a outros corpos, decerto tão radiantes talhados dilacerados febris e apaixonados e apaixonados e apaixonados, a dor agridoce de não se saber ser inteiro em um corpo só.


(Ah, vai. Tinha um contexto, juro.)

domingo, outubro 15, 2006

nem.

Hoje eu vou ignorar essa inquietude e fingir que não. Nem há nada a ser dito por enquanto.

[talvez de manhã, talvez já com fôlego, talvez sem as mãos sempre trêmulas e a cabeça nos dias passados.]
Que sentir só faz embolar as pernas e as palavras.

Boa noite.
:)

quinta-feira, setembro 21, 2006

títulos ás vezes são imbecis.

É estranho reencontrar, depois de tanto tempo, aqueles soluços que eu aposentei na estante, junto com a poeira daquelas notas e letras que eu julguei já não me serem necessárias.
Passou tanto um tempo e tantas foram as coisas que me atravessaram, mas eu ainda não sei medir quanto foi que se desvaneceu nas folhinhas arrancadas da parede e o que foi que se solidificou por aqui, somo se, porque arraigado hoje, não fosse me abandonar mais.
Aquele frio que não se esvai com qualquer calor, e o peito convulso e desesperado eu já conhecia de outros anos, mais imaturos e confusos, mas nem por isso foi menor a minha surpresa ao perceber que eles não são característicos de uma época, e sim desse conjunto de peles e ossos e pêlos e carnes que não concordam entre si.
É que talvez já fosse prá eu saber que aquelas notas e letras ainda me são [des]necessárias, e vão sempre fazer das minhas intrusas "auto-invasões" esse monte de soluços prá dentro, a acusar o que foi que sobrou de infância em mim.



[monotemática, monotemática, monotemática. eu já ia dizer que é fase e que passa, mas, sabe como? se 'o blogueiro é um fingidor' já era prá eu ter posto a cabeça prá funcionar há muito tempo... as coisas são largadas aos poucos, mesmo. "foimal aêêê véi. disculpintão!" ¬¬]


[Edited}

Palavras também.

terça-feira, setembro 12, 2006

where is Donnie?


[legendinha desnecessária a da foto. e essa aqui também.]

A nebilina de dia que nasce desperta Donnie, que ia jogado no acostamento da rodovia a dormir sabe-se lá desde quando. O menino levanta meio confuso, sacode a cabeça prá dar jeito nas idéias e ri com o canto da boca ao [não] lembrar-se do ontem. Põe-se sob a bicicleta e pedala com a pressa dos novos até sua casa.
Pros ouvidos, Killing Moon.


É por cenas como esta que Donnie Darko me ganhou. Eu não vou mentir e negar que a trilha sonora, extremamente bem composta pelo melhor da década de oitenta [com direito a Love will tear us apart, uma das minhas favoritas entre as dessa época, e talvez até entre todas as músicas], tem grande importância no meu apreço pelo filme, mas há tanto mais.
Prá dizer do enredo, este sustenta-se no protagonista que dá nome ao filme: um adolescente com distúrbios psicológicos aliados à óbvia dificuldade de se ter uns dezesseis anos. Daí para sair perâmbulando sonâmbulo pela vizinhança e bater um papo com Frank - um coelho gigante e assustador que ele adota como amigo imaginário - é um pulo.
É fato que se não for tratado com certa cautela, este tipo de mote pode não conseguir desenvolver mais que outro filme de "adolescente doidinho", mas em Donnie Darko, as questões abordadas, a forma inusitada com a qual a câmera as retrata, o bom desempenho da maioria dos atores e o toque de absurdo que permeia toda a história culminam em um resultado final excelente.
Dirigido por Richard Kelly, produzido por Drew Barrymore [ééé, aquela que fez E.T, foi Pantera e hoje em dia passa bem com o Fabrizio dos Strokes] e protagonizado por Jake Gyllenhal [o moreno de Brokeback Mountain], Donnie Darko foi filmado em 2001, mas por passar-se em 1989, recria perfeitamente aquela estética própria da transição do 'zanzoitenta' para os noventa - com direito a participação de Patrick-I-had-the-time-of-my-life-Swayze e cintão de um palmo na cintura de Drew Barrymore.
Só é meio difícil de achar [eu consegui assistir ontem, numa exibição no CCBH, depois de procurar muito].
Mas dê seu jeito, se vire. É daqueles que deve ser assistido.

segunda-feira, agosto 28, 2006

Primeiro [ou Junkie Mirim]

Fazia sol? Eu nem lembro se fazia sol. Eu lembro que tinha areia - aos montes e montes! - e a pele toda seca de sal, pensei até que podia se rasgar que nem papel se alguém quisesse.
Dava prá ver só os peitos do zoto lá da minha cadeira, que o resto todo o tampo da mesa tampava. Porque é que gente grande faz as mesas tão altas se criança também vai sentar nelas? Eu achava tudo muito errado, essa coisa de ter que me espichar toda no meu assento prá acompanhar as conversas da roda, como se ali nem fosse lugar prá mim. Ora, colo de pai servia então era prá isso, além de que o apoio é tão melhor.
Na altura que eu queria, agora sim, começava a ficar bom. Faltava era só meu guaraná, talvez. Mas pai cantava um samba tão alto e deixava tanto a gente ver os seus dentes, que não me ouviria de jeito nenhum, nem que eu puxasse a beirinha da camisa dele.
Fui nos guaranazes que já estavam na mesa, então. Eram mais amarelinhos e tinham até mais espuma, mas vai ver era só uma marca diferente, o meu irmão ele tinha levado lá em casa outro dia um que nem gosto de guaraná tinha, parecia era aqueles sucos da merenda da escola, tão doce.
Quando me viram levar o copo amarelo na boca teve quem riu e teve quem fez bico de não. Eu entortei a cara, que aquilo ali era meio amargo demais e não parecia nem de longe com o gosto ardidinho que eu ia esperando. Mas pai não cansava de nem me perceber, e a sede que ia aumentando eu resolvi que ia matar ali mesmo, no seu copo. Não demorou e, sabe que eu já nem sentia mais sede?
Tava preocupada era em rir riso dos outros, esquecida numa vontade estranha de cantar bem alto, de sair correndo onde é que fosse, de mandar longe os chinelos e pegar onda - todas.
Não sei direito como, mas foram me achar perdida em gargalhadas já na beira do mar, querendo - eles que falam - medir o limite certinho onde água não pegava areia, cortando com passadas tontas a maré, me derrubando no raso das águas, desfeita do biquininho verde, que já ia boiando longe.


[A gente cresce e aprende (pelo menos tenta aprender) a medir - a quatidade e as consequências. Uma pena, convenhamos.]

domingo, agosto 20, 2006

despropósito.

...tremia de vontade - tão forte que nauseava - de não ser. Parecia que o que havia pelo lado de dentro se debatia entre uma e outra extremidade da carcaça na tentativa vã de fugir antes estrago iminente.



Tolice. Nunca se lasca só com o corpo e haveria, sim e sempre, de sujeitar o resto às cicatrizes antevistas.

domingo, agosto 06, 2006

retrato [de novo].

Sempre há de restar um tanto de mundo em mim.
Dos talhos que levei na alma, dos sorrisos que fingi serem verdadeiros, das dissimulações - estas tantas - eu trago em mim as cicatrizes.
Restou muito de mundo em minhas mãos trêmulas, em meus olhos fundos que se arrastam sob dois negros buracos, em minha pele cinza que sente e nunca deixou de sentir quão pesado é o existir.
Ironias... ["Porque sou uma vida com alguma ironia furibunda."] O mundo que se tatua a cada dia em mim é o mesmo que me recusa, que em faz estrangeira em meio a luzes e carros e cidades e a elas - as tais pessoas.
N´algumas memórias, contudo, eu caibo, que o tempo é senhor destes jogos com as lacunas das lembranças, que tornam o ontem tão mais doce.
Eu me perco a atravessar o vão do passado, flutuando pelo que há de suspenso até encontrar-me comigo mesma, outra vez. É quando percebo que me reflexo no espelho das memórias não me pertence.
No agora, não mais.

[Mais de meio de Julho, lá da oficina em Diamantina, depois de um tanto de Herberto Helder e Al Berto.]

terça-feira, julho 25, 2006

Aquele caos bem óbvio.

Difícil precisar quanto eu trouxe daquele horizonte agressivo e quanto de mim eu deixei naquelas pedras. Ás vezes acho que perdi a ganância pela razão num tombo numa escada de madeira, na perca do fôlego por aquelas ladeiras, num arrepio de frio que outros braços tentaram conter.
É que agora parece tanto haver uma falta de sentido onde tudo foi, um dia, ordem, que eu me sinto mais em casa, ainda sem pertencer a lugar algum.
Lembro-me de como me senti cabida no caos daquelas vozes um tanto desafinadas, nas danças que não seguiam tão harmoniosamente o compasso, cercada por paredes que não se punham paradas. Meu sorriso outrora tímido a se dar para amigos fugazes, cujos rostos eu nunca mais verei, as verdades pulando prá fora de minha boca e eu sem fazer esforço algum prá contê-las.
Nuns ombros talvez tão pesados quanto os meus eu reconheci mais que eu mesma: percebi que não havia porque ir em frente com minhas vãs dissimulações, se sobre mim se postavam uns olhos amigos - estes não fugazes - que talvez se deixassem confortar no caos tanto quanto eu.
Lá fora o dia se pintava em cor nenhuma senão branco, e antecedia a minha ressaca. Eu caminhava pelas pedras sem a mínima pressa de deixar prá trás a cidade [na verdade pus até os olhos fechados prá ver melhor a minha paisagem] e, no frio bom de dias de inverno recém-nascidos, eu me fiz criança de novo, a ver mais com o arrepio dos pêlos que com a obviedade redundante dos olhos.
Diamantina me foi, e eu quero que sempre me seja, muito.


[Arrisque-se, deixe-se acreditar, seja auto-ajuda e novela mexicana vez ou outra, que o torpor não dura tanto tempo.]

segunda-feira, julho 03, 2006

Turn off.

O menino do mombojó pedindo samba prá aquecer, algo prá beber, um tal de 'você', que a mim já não cabe saber quem é, e eu só sabendo que é difícil discordar da música numa hora dessas. Pior ainda é discordar quando ele diz que tudo pode ser e essas outras coisas que, convenhamos, a gente tá calejado de saber que não são e nunca foram verdade, mas que em música ganham uma dimensão gigante e põem a gente de olho fechado e as mãos assim, bem cerradas - quando eu tinha unhas elas bem cravavam a palma nessas horas - prá combinar com a força da voz.
Eu não discordo, então, e deixo os meus olhinhos enganados passearem pelo quarto já escuro e bagunçado, como se eu realmente visse nos objetos espalhados um monte de falhas na harmonia que um dia já existiu aqui; como se tudo isso que se faz palpável não fosse só um descanso pros meus olhos se apoiarem, enquanto eu caminho prá dentro de tudo que não pára o toque.
Eu vou pras lembranças e pros anseios e pras risadas só minhas e pros medos e pras dúvidas e prás indagações e pros desequilíbrios e pras lembranças e pras lembranças e pras lembranças.
Não sei te dizer quantos anos e quantas vidas eu vejo passar até que os metais e aquela voz rouca cantando que pode ser da vida acostumar me tragam de volta ao ponto que outrora foi minha partida. Não te diria também se me volto mais leve ou contrariada comigo mesma. Não é por aí. Só sei te afirmar com algo que beira a certeza que, poxa vida. Deixar de ser por um cadinho não é lá das piores idéias não, viu.


Versão curta: Tô viva, ouvindo Mombojó, viajando e ouvindo Los Hermanos quando me dou conta.

quinta-feira, junho 22, 2006

Pergunte ao 'pó'.


[Camilla Lopez (Salma Hayek) e Arturo Bandini (Collin Farwell).]

Minha opinião sobre Pergunte ao Pó, um dos filmes que eu mais esperei nos últimos tempos, sem dúvida será contaminada pelo fato de que ele trata-se de uma adaptação cinematográfica do livro de John Fante que, se não é o, passa muito perto de ser um dos meus preferidos. Prá mim, então, foi praticamente impossível assistir ao filme sem tecer comparações ou preencher as prováveis lacunas existentes na obra com passagens do livro. Em suma, prá mim é muito difícil perceber o filme como obra independente do livro, como eu acho ser o justo.
Mas o que eu pude concluir, apesar de todos esses pesares e impecilhos, é que Pergunte ao Pó é um filme médio, que se aproxima mais de ruim que de bom, independente de ser ou não 'fiel' ao livro [termozinho esse que também dá um pano bom prá manga, viu]. A questão toda é que a trama do filme sustenta-se quase que completamente no relacionamento entre Arturo Bandini e Camila Lopez, quando este relacionamento não é tratado de forma complexa ou problemática o suficiente para preencher as duas horas de filme. É nesta parte, então, que o diretor utiliza superficialmente aquilo que, no livro de John Fante, é o principal: A vontade do protagonista Arturo de tornar-se escritor [e os constantes duelos que ele trava com si mesmo devido a essa cisma], e o olhar que este lança sobre os estrangeiros [imigrantes ou filhos de imigrantes] que, como sua família, viram nos Estados Unidos a possibilidade de constuir - ou reconstruir suas vidas.
Se há de se falar em falta de verossimilhança em Pergunte ao Pó, eu não diria da não correspondência do final do filme com o final do livro, ou das outras tantas mudanças na história; o que mais me causou estranhamento foi a forma como Camilla passa de indomável a completamente doce e vulnerável em apenas uma cena, para, em seguida, de súbito, esquivar-se de Arturo novamente.
Para mim, a maior falha da versão cinematográfica do livro de John Fante é deixar de lado aquilo que faz dessa obra algo tão especial: o pó. Dois jovens bonitos passando férias numa casa de praia branca, com direito a café na cama e lições de alfabetização não são - e dificilmente serão - a base de uma boa história, e muito menos são o Arturo e a Camilla que trocaram farpas, beijos e dores naquele Pergunte ao Pó das letras.

terça-feira, junho 13, 2006

Lacuna Inc.

Pensando hoje se será se Dora me vem. Que ontem foi daqueles dias friozinhos e cinzas, aqueles que quando a gente olha pro céu tá tudo tão claro e tão nada que a gente não sabe e não pode conter o pensar. E foi ontem que, como anteontem e anteanteontem, eu me pus a lembrar de Dora e daquele jeito manso que ela bem tinha de chegar até mim; pura falta de jeito, o jeito cheio de graça, os cabelos pretinhos prendidos em trança, quietinha a me esperar responder às suas batidas hesitantes em minha porta.
De quando a pele dela inda era rija... é mais nessa época que eu me paro e deixo as horas se escorrerem - passam ilesas, que eu fico sentado comigo nessa varanda, a prender os olhos na rua, mas vendo é Dora chegar-se prá mim. Nos outros tempos adiante eu também ás vezes me deixo ficar; a trança já se prateando e uns sulcos a tomarem-lhe a carne - mas ainda era minha, ainda era Dora.
Eu tento lembrar quando é que ela se saiu assim de mim, quando foi elvar sua voz baixa e docinha prá falar noutro lugar, quando foi que não me acontecia mais a sua presença franzina, cortando o monótono do meu dia. Mas as lembranças agora me são tão confundidas; há um tanto de buracos naquilo que era o todo das minhas memórias, como se o pano que antes fora inteiro agora tivesse se brocado em renda.
Eu sei, sei sim que o outro lado da calçada que eu miro todos os dias enquanto me deixo ficar aqui sentado não me trará as respostas nem encherá [como um sopro] a lacuna que falta, a lacuna que dói. Mas já é meu hábito e já faz parte da minha idade esperar, esperar, esperar.
Vou pensando hoje e ontem e amanhã se será se Dora me vem. É bem verdade que a resposta eu já tenho comigo - mas me deixa ser, que a lembrança me aquece, e a espera toda me faz o tempo passar.



PS:[Sumi tempo suficiente prá fazer 19 anos e outras coisas. Agradecimentos gigantes a todos aqueles que sempre fazem do 12 de junho meu aniversário, e não uma grande dor de cutuvelo.]

segunda-feira, maio 29, 2006

1312 - a.k.a conversando com o espelho.

Não sei. Mas ás vezes tenho saudade dum virtuosismo antigo, que eu nem sabia existir em mim.
Soa ridículo, sair da boca de uma menina de - quase - dezenove anos esse tipo de frase, eu sei que soa. Acontece é que eu costumo me sentir como se envelhecesse não um dia a cada pôr do sol - daqueles que dividem o céu em rosa escuro e azul, quase seis da tarde, já reparou que bonitos que são? -, mas um ano. Menos no sentido de adquirir experiência; mais no sentido de ir me opacando.
Ao mesmo tempo vem aquela sensação de inércia, de achar que já se foram uns bons anos e essa mesma bundamolice, essa falta de coragem de pôr na parede e falar que é isso e perguntar se entendeu olhando nos olhos e arqueando as sobrancelhas assim, que ás vezes é bom fingir um cado de impaciência - faz a resposta vir mais rápido.

Esses meus draminhas de crise de meia idade precoce, eu sei que são chatos. Pior é saber da boca de Piaget que, a essas alturas, pouca coisa ainda muda por aqui, a não ser que algo de muito extraordinário ocorra.
O problema é que eu já combinei com Thom Yorke e, ainda que encha o saco, nós cantamos prá mandar prá longe de nós os alarmes e as surpresas. Sabe como é... apatia cai bem em rostos desarmônicos.

No mais, tudo bem. Eu só tava com vontade de escrever o 1312º ´post dessa coisa aqui, achei um número bom.
E a tua família, tá boa?
dê lembranças.

sábado, maio 20, 2006

Pablo - Cora

[Para o 28º Concurso Maldito.]


Acho até que aprendi a gostar desse barulho indefinível e humano que fazem as pessoas quando são muitas, dadas as tantas vezes que ele me foi companhia enquanto eu esperava Pablo apontar de algum canto, atrasado como sempre, e já sei que ela fará aquele bico com os lábios, aquele que um dia cheguei até a achar engraçadinho e que hoje só me faz questionar porque ainda levo isso a frente.
-"Sinceramente não sei.", eu digo e retorço os lábios pra que ele perceba que me cansa estar sempre por sua conta, pra que ele entenda que tanto me faz o que jantaremos e prá que ele, se for isso aqui menos bobo, atine para o fato de que, por deus, não fica bem com essa camisa gola pólo eu até vesti pra não ter de ler nos olhos de Cora a censura muda que por vezes ela faz de minhas roupas.
Mas já não há jeito de agrada-la e a noite será de poucas palavras depois e o garçom chega para receber nossos pedidos. Ele erra a pronúncia do francês ao pedir o prato, como sempre, e eu disfarço o constrangimento com um sorriso falho, que só faz, na verdade, traduzir a pena que sinto pela sua burrice, burrice! e eu me castigo internamente por não ter dado a ela atenção quando tentava-me ensinar, ainda em tom de brincadeira, a pronúncia daqueles "ôs", "ís" "tré´s" que, da boca dela fluíam tão naturalmente e me embaraçavam todo esse silêncio entre nós dois... eu tento lembrar quando é que foi que ele se instalou com essa força, como se nunca tivesse sido cortado por palavras. Tento me lembrar quando foi que parei de ver nos erros de Pablo a graça de sua imaturidade.
Ele me parece agora ter deixado só o corpo por estas bandas, pois não me mira os olhos enquanto me pergunta "Como foi o dia?" e as palavras pulam automáticas de minha boca, na tentativa já fracassada de puxar algum assunto e mandar pra longe da mesa essa sensação de que só estamos aqui, travando este combate surdo contra nossas reais vontades, porque, como namorados, isto não seria mais que nossa obrigação.
Cora me diz que "foi bom, e o teu?" é o máximo que consigo responder, afundando-me no ridículo da trivialidade, antecipando aquele silêncio instalar-se entre nós outra vez e apontar que já não temos mais o que dizer um para o outro, e eu sinto-me entristecer por perceber que, assim como Cora já não me é necessária, para ela eu também não o sou.
O garçom tráz o nosso jantar e comemos, tão maquinalmente como, horas depois, ela sente o meu peso sobre seu corpo já me é tão indiferente que tenho vontade de que ele acabe logo para que eu vire-me pro meu lado da cama e finja dormir, as frases amargas que eu nunca direi a Pablo querendo-me saltar à boca fechada, eu não falarei a Cora sobre o nosso fim, que não há porque mostrar a ela aquilo que qualquer um vê.

O sono pesa-lhes as pálpebras e finalmente dormem; cada qual embalando seu defunto interior.

terça-feira, maio 09, 2006

Logo cedo, de manhã.

Foi quando eu corri os olhos pelo mundo cá fora, na tentativa, mais tola que vã, de capturar algo que me saciasse pelo lado de dentro.
Havia uma mulher daquelas que andam como se clamassem por serem descritas [e eu não soube transformá-la nas palavras corretas - desculpe a incompetência, moça]. Havia ônibus rugindo e cuspindo pessoas que, tão preocupadas com o gerúndio cotidiano, pareciam sequer existir de verdade. Pensei talvez fazerem elas as vezes de figurantes de meu mundo, mas a falta modéstia que eu nutro de mim para comigo mesma mandou-me desvanecer logo esta idéia, que, onde é que já se viu tanto umbiguismo logo cedo, de manhã.
Resolvi então que era hora d´outro parágrafo, que do lado de fora eu não ia me virar bem não - e é sempre assim, há em mim um centro de gravidade interno, que me puxa e me traga sempre prá dentro de mim mesma, fazendo esvair-se em pensamentos meus o mundo aí fora. Pude eu discordar de mim mesma quinhentas vezes, resolver que talvez fosse hora de tomar rumo novo, ou de colocar gosto nas coisas que eu me dou a fazer. Mandei-me à merda continuamente, também, que não haveria porque me perter em tantas divagações e deixar que as coisas que existem - você, eles, fome, acordar e ver gente, sabe? - escorram de minhas mãos para que eu me reecontre comigo e com mim mesma outra vez; era redundância sem sentido.
Eu tinha casado de ser eu, então, devia ser. Contudo não queria desejar - tampouco queria querer - ser outra pessoa. Ranquei, portanto, o Cortázar da bolsa, mas o último conto já tinha me baqueado o suficiente prás horas seguintes. Tentei me concentrar no que diziam as pessoas; olhei prá baixo em fuga irônica quando pressenti meu reflexo a se desenhar torto no vidro dos carros. [Àquela hora eu me agarria a qualquer fio-de-ariadne fajuto que me levasse prá fora daquele labirinto interno.]
Quando despertei - súbita -, de meu comazinho particular, já era um texto findado, já estava eu descarnada em palavras; trocentos ônibus e olhares eu havia perdido; já tinha eu pingado o ponto final.



[Vezenquando a gente cansa de inventar. E isso aqui já foi tão mais 'diário', que eu não vejo problema em, vez ou outra, usar a primeira pessoa.]

domingo, abril 30, 2006

Domingumbigo. [ou considerações bestinhas sobre eu eu eu e eu num feriado.]

Pensando hoje que, se houvesse mesmo um lugar no qual as coisas fossem todas elas e elas todas de acordo, aquelas esfihas de cheddar com peperoni do Habib´s teriam o mesmo valor calórico que uma folha de alface. E eu nunca ia pedir aquela última que eu como mais por dó de deixar sobrar que por fome; aquela que me faz ficar em estado de quase-morbidez por horas após a refeição.
E a programação da tv no domingo não incluíria O Pequeno Stuart Little a ser reprisado pela quinquagésima vez - lixo cultural seriam os programas da Rede Minas, se é necessário um parâmetro.
O ócio não traria a inquietação de ter de se fazer alguma coisa quando há folga, e a vida toda seria calma e confusa como o acordar no campo da Lux em As Virgens Suicidas. No sábado precedendo chuva, o rapaz do salão não me trataria por vocativos irônicos como "florzinha", "neném" ou "lindinha", e o esmalte vermelho recém passado não descascaria momentos após o pincel tocar as unhas.
Eu diria prá você as letras das músicas que ouço durante o dia inteiro sem vergonha de te mirar os olhos, e também não teria que dissimular meu encanto com aquilo que, em você, os outros tomam como casual.
Sobretudo, você saberia exatamente o que é que se passa na minha cabeça e não teria a menor vontade de dizer 'não'.

domingo, abril 16, 2006

Por encomenda.

De longe era só aquela capa de frio azul que cobria até o joelho saltando duma esquina não menos sórdida que as outras esquinas daquela cidade. Vinha com o rosto enterrado na gola alta do agasalho, e olhava de solsaio para os neons coloridos das placas que faziam a noite urbana parecer uma puta, caricatamente pintada pro seu próximo parceiro qualquer.
Acho que ele teria um gingado bonito no andar, não desconfiasse serem seus passos alvo dos olhares de alguém. Andava então pesadamente, como se quisesse deixar o bico quadrado dos sapatos gravado no cimento das calçadas. A certo momento, contudo, estacou. Tateou os bolsos à procura de algo que lhe parecia imprescidível, e retorceu o rosto ao achar só algumas moedas. Os olhos meio fundos iam semicerrados pelo franzir das sobrancelhas, e a boca fina contraía-se para a esquerda como se quisesse mostrar que, hey, ele realmente estava fodido com aquele monte de frio e aquela falta de dinheiro.
Lançou-se então ao redemunho de carros que cortavam a avenida na tentativa de ganhar a outra esquina - contudo, parece-me que do lado de lá também faria ele só vagar com aquele semblante casmurro [atraente, porém]. Deixou que alguns automóveis desviassem de seu corpo enquanto fitava um horizonte banal, até alcançar a calçada. E de lá, agora dava as costas a mim. Pude ver o puído da barra de suas calças e o gasto dos sapatos pretos que iam e iam e iam e iam.
Eu esperei pelo momento em que ele fosse, de supetão, virar o corpo e me encarar cá em cima, mostrando a mim só o dedo do meio, ou pegando no saco e segurando-o com rispidez, como quando fazem os garotos irritados que querem dizer "chupa!" gestualmente. [É que eu percebia pela artificialidade nervosa dos trejeitos que ele odiava ser despido por minha mira.] Mas que nada. Continuou a se afastar cada vez mais, como quem pune um pintor recusando-se a servir de modelo já pelo meio da obra.
Fechei a cortina, então, cansada da brincadeira e resolvi que talvez tivesse eu algo melhor a fazer. Foi quando, com a elegância ácida de quem vence, ele voltou-se sutilmente prá minha janela e bufou um sorriso de cantinho de boca.
- Tola.

sábado, abril 08, 2006

Semibreve.

Era noite daquelas em que a janela jazia aberta com o único propósito de trazer frio - ainda que uma brisa; talvez até um sopro.
Os olhos percorriam as letras dum livro, buscando ora esquecer-se da vida, ora tomá-la escancarada na cara. Começara até a simpatizar-se com a personagem que ameaçava brotar do espaço entre as linhas, quando entrou mais que pouco frio pela janela.
A sinfonia urbana de carros e alarmes e choros e freios e berros e ódios, mortes e, - sobretudo - cinzas, pareceu se calar por alguns instantes prá ouvir e fazer ouvir o som do piano que emergia sabe-se lá da onde.
Como se sentisse gelada a alma toda, ela se desfez do livro e, em menos de duas colcheias, já postava-se à janela. [tudo à sua maneira: a perna direita cruzando atrás da esquerda; o queixo apoiado nas mãos; o rosto a lavar-se na noite.]
As notas entravam por seus ouvidos e faziam-se reconhecer (ré-ré-ré-mi-ré-dó...) e aumentavam nela aquela aflição (lá-mi-ré-dó) que sempre era sentida quando dessas coisas triviais que assustam de tão bonitas.
Era Lua Branca, e era Chiquinha Gonzaga.
Olhos agora perdiam a razão de ser, que os outros prédios e a rua e a noite davam lugar àquelas lembranças doces. O piano de armário da professora, a partitura a ser vencida, tantos erros - os dedos se atrapalhavam em demasia - a música finalmente enchendo a sala, o peito se inflando com a harmonia daquilo tudo, a perca do raciocínio, o mundo a resumir-se à Lua Branca que escorria de suas mãos.
O piano continuava a ressoar o seu passado (lá-mi-do-ré...), como se tocado para ela e só. As pálpebras recusavam-se a se desgrudar, clamando por não se desvencilharem da ebriedade daquelas memórias.
Foi que, numa sintonia inconsciente, os ré-lá-ré´s supostamente finais da música emendaram-se noutros ré-ré-ré´s, musicando ad infinitum aquele sonho de garota que faz da alma reduto de lembranças, de melodias, daquelas coisas boas e semibreves que cheiram a naftalina.

domingo, abril 02, 2006

segunda-feira, março 27, 2006

Desgraças a postos?


"Eu morava num barracão de lona na beirada do rio, pescava peixe prá comer e fui chifrada em rede nacional. Mas não vou ganhar 1 milhão porque a baiana, além de feia e véia, já passou fome. snif. :~"

Eis que no domingo à noite, ao invés de ler os textos das aulas de segunda de manhã, eu tava lá, largada no sofá vendo Big Brother. Em tempo: tenho noção da ridicularidade de minha condição - pintassem-me de amarelo e postassem sob minha barriga uma Duff, eu passaria bem como Homer Simpson.]
Contudo, não vamos entrar no mérito da minha falta de dignidade. Eu dizia sobre o BBB. Pois bem.
Passa que, a certo momento, Pedro Bial [mais tarde trataremos da superestimação desse, hunf, JORNALISTA.] convocou os três finalistas a resumirem em um segundo toda a história de suas vidas. O que se seguiu ao pedido foi algo semelhante a um desfile de desgraças: a baiana já passou fome; a modelo morou em barracão de lona e o professor passou por "momentos muito difíceis" em sua vida - o pobrezinho não conseguiu relatar tragédias que competissem com as de suas companheiras.
Todo esse freak show desperta minha curiosidade para o fato de que o brasileiro parece ter uma atração quase que, eu sei lá, sádica, por desgraças. Bom sujeito é sempre aquele que passou pelos piores perrengues e ainda assim, *arrem* venceu na vida. Aquele que, coitado, teve o azar de nascer em berço rico não é digno de admiração porque não foi "guerreiro", não "ralou", sabe como?
E esse fetiche por mártir não se reflete só em biguis bróderes ou filas do pão. Experimente você, seu classe média sem calos na mão, reclamar com teu pai que pegar ônibus às 7 da manhã é participar de uma suruba tão involuntária quanta indesejada. Ha-ha. Provavelmente ouvirá um sermão já conhecido, de longa duração, envolvendo milhas e milhas a separar residência de escola, pés descalços, sóis escaldantes e falta de dinheiro prá merenda no recreio. Raríssimo ser diferente.
Eu não digo aqui que o esforço das pessoas não deve ser reconhecido - pelo contrário, até invejo a paixão de alguns sujeitos. O que eu acho é que gente possui outros valores importantes além da garra e, sobretudo, ninguém precisa necessariamente ter comido o pão no qual o demo sapateou para ser bom, ou digno. Caráter tá ligado é a outra coisa.
Por outro lado, eu compreendo que essa característica comum a muitos brasileiros tem justificativa menos simplista [e menos mal humorada, né, Dona Lara?] que o sadismo: Louva-se o sofredor por esperar-se que sua própria sofreguidão seja um dia louvada. Mas isso aí, até eu, burguesinha-classemédia-unhafeita-internet, sei que não se resolve tão cedo.
Que vão adotando seus mártis, então. Quando se cansarem daquele da cruz, vai o mais chorão do Big Brother, mesmo.

[Em tempo: depois do comentário, preciso nem dizer que aposto em Mara como ganhadora do 1 milhão, néam?]
[De novo: Eu assisto BBB sim. E, ó, nem vem... quero saber de vida ruim sua não, rapá.]

segunda-feira, março 20, 2006

A reason for living.

[Para o 20º Concurso Maldito.]

Com a doce impaciência infantil, ele posa para a câmera do pai. Os bracinhos arqueados e o quase-sorriso já indicam a meia volta iminente que o corpo fará para, em seguida, correr com passinhos desajeitados a jogar areia nos cabelos nas pernas nos rostos - alheios - até chegar logo ao mar.
Aquele milésimo de segundo em que a luz mancha o papel com a pequena figura inquieta, circunscreve coisas que a vivência de toda uma vida não explicaria. A obra mais prima de todas a se eternizar numa foto.
Os olhos negros se contraindo, talvez em dúvida, por não saberem quanta vida ainda lhes fará molhar - tristeza cortando a alma ou felicidade descabida. A etérea pequenez que exige cuidados, mas que é sobretudo efêmera - tal qual éter.
A segurar a câmera, mãos que certamente serão refúgio quando o moinho do mundo reduzir as ilusões a pó. Tenra autoridade paterna, tão forte e tão sóbria, mas que, frente a um garotinho ansioso por correr pela praia, se faz apenas um bobo, um apaixonado, um pai, a ver nos cabelos molhados e nas bochechas rosas uma razão prá viver..

segunda-feira, março 13, 2006

Ohnos <<

Passos em regressão a ecoar na bela rua fria. Um fechar-contrário do portão da frente, a porta enfim e as chaves ainda recusando-se a vencer a fechadura - porém não seria agora que até as coisas inanimadas diminuiriam-na.
Atrás da porta não era lugar mais quente que a rua. Havia ali tensão que de tão densa se fazia palpável, tão grande que a comprimia. O lado de dentro e ela prestes a livrar-se do lar que ganhou sem pedir.
Pela sala minúscula as costas adentravam, a cada passo contrário mais pesadas, mais curvas, mais velhas. Os olhos já miravam o chão quando chegaram ao quarto de lençóis rotos e cama pequena demais praquele corpo, franzino contudo mais forte que os músculos de quem costumava deitar-se a seu lado, roncando a preguiça de todo um dia, de toda uma vida. Em sua última olhada àquele corpo gordo a sorver prá dentro de si os ruídos que abafavam o quarto, não conseguiu ser dona de sensação alguma.
Ponta do pé e então o calcanhar; ponta do pé e então o calcanhar, arrastou seu corpo de menina até a cabeceira da cama e lá deixou sua bolsa. De dentro dela, com dedos desajeitados, puxou o pequeno canivete e postou-o sobre o criado-mudo. O Guarda-Roupas a seguir recebia o já puído casaco de grandes botões beges, que deixava ver agora só a camisola de algodão a tapar a pequena silhueta.
De súbito o colchão respondeu ao pouco peso que ali se postava, afundando-se sutilmente, bem como o travesseiro que se amassara com o pesar da cabeça. Antes de cerrarem-se, os olhos fitaram por breves segundos o teto, antecipando o reverso do despertar.
Acontece que ela sonhara que podia ser mulher, que era maior que o teto de seu casebre, que suas mãos não estavam atadas, e ela poderia, sim, ter vontades e idéias. Sonhara que seus olhos eram dum preto vivo, que nunca haviam sido opacados pelas lágrimas. No rosto a pele se livrara daqueles talhos de unhas de dentes de palavras e a boca sabia se abrir em sorrisos.
Acontece que ela sonhara que podia ser gente e finalmente acordou disposta a viver.



[Idéia antiga, que eu não consegui fazer funcionar satisfatoriamente. Ainda assim, taí.]

quarta-feira, março 08, 2006

Brokeback Mountain.


[chorante. :~]

Assisti O Segredo de Brokeback Mountain hoje e não vi um filme gay. Durante as duas horas e mais um pouco que passei no cinema, o que eu contemplei foi a história de um amor proibido, que, justamente por isso, impede aqueles que o consumam de seguirem em frente com suas vidas.
Muitos são os filmes que utilizam esta fórmula como tema principal, contudo, não é o fato de os protagonistas de Brokeback Mountain serem do mesmo sexo que faz deste um filme diferente, e sim o tratamento ao mesmo tempo realista e sutil dispensado ao relacionamento das personagens principais, a belíssima fotografia, as notáveis atuações, a boa direção de Ang Lee, enfim.
O preconceito relacionado a O Segredo de Brokeback Mountain não está dentro das salas de cinema, ou nas torcidas de nariz para as cenas mais explícitas de sexo homossexual; o preconceito encontra-se nos comentários que reduzem esse filme apenas ao relacionamento entre dois cowboys gays, quando este é apenas um detalhe entre tantas outras questões abordadas por um belo filme.
Assistir Brokeback Mountain e rotulá-lo como um filme de temática gay é comprovar a posse de uma mente medíocre, incapaz, tanto de desfazer-se de conceitos ultrapassados, quanto de se enxergar numa história que trata de algo com o qual qualquer ser vivo respirante já se deparou: um amor puro, contudo impossível.

sábado, março 04, 2006

cinco e trintêquatro.

Quando eu olho distraída pela janela e encho os olhos com um céu desses, eu penso que dormir antes do dia ficar claro é besteira.
É besteira, que esse azul claro a se misturar com o laranja dumas nuvens fracas - prestes a tomar corpo com o passar das horas - é presente até pra mais amarga das almas.
É besteira, que sentir o frio de dia novo entrando pela janela e ouvir o silêncio de ruas ainda virgens, é o suficiente pra despertar em mim a vontade de me esvair pela greta das grades desse quarto, e ir tocar o chão fresco do lá-fora.
Talvez eu toparia comigo mesma subindo distraída morros, fazendo sinais prá ônibus, deixando cair as modedinhas da passagem. Talvez esbarrasse com uma Lara a voltar cambaleante prá casa, as sandálias na mão e o cabelo desgrenhado, um sorriso antecedendo a ressaca do dia seguinte. Talvez eu andasse errante por entre caminhos que desconheço, o dedo procurando uma campainha pra tocar, "é cedo, ainda" a martelar a consciência, pés refazendo o caminho prá casa.
Na verdade, só um texto, um dia já azul, a cama aqui do lado.

Boa noite.

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

Ai quent guét nou.


[Eu me pergunto prá onde foi todo aquele sex-appeal do video de Simpathy for the devil.]

Tente visualizar: Um milhão e lá vai pedrada de pessoas numa praia, num mesmo momento dum mesmo dia, assistindo um show gratuito. Adicione à cena apenas mais duas informações, quase que irrelevantes: a praia é Copacabana, no Rio de Janeiro, e o show é dos Rolling Stones, banda que só não tem mais aceitação familiar que o Abba. [Não disfarce, teu pai é fã , tua mãe adora e teu avô balança os ombrinhos quando ouve.]

Quase isso, né?

"O levantamento dos bombeiros inclui ainda 28 afogamentos, um parto, um atropelamento e três pessoas esfaqueadas. A Polícia Militar, por sua vez, registrou apenas um caso de esfaqueamento."

[Um caso óbvio de mistura de cachaça, empolgação ébria, mar e (!) uma mulher grávida de 9 meses. De fato tinha tudo prá dar certo.]

Tem mais:

"O show dos Rolling Stones, que reuniu cerca de 1,3 milhão de pessoas ontem à noite na praia de Copacabana (zona sul do Rio), terminou com 22 casos de crianças perdidas."

[Esse aí eu já não consegui entender. Porque diabos se leva uma criança a um lugar abarrotado de gente fumando/bebendo/cheirando/trepando e outros gerúndios proibidos na novela das 9? Talvez seja o novo método carioca de livrar-se da cria - mais eficiente que a prática do bebê à lagoa, comum aqui em Minas.]


E digo ainda que a polícia se livrou de tarefa mais árdua que resgatar bêbado de mar e fazer serviço de parteira: ter de lidar com a possível morte de algum dos integrantes do Roulim Estones, já que as possibilidades [overdose, infarto, overdose, overdose, derrame, overdose, susto, velhice...] não eram remotas.
Não que eu estivesse praguejando contra quem foi ao show ou coisa do gênero, mas esse monte de gente, numa cidade que não tem lá a melhor reputação, se matando prá ver no palco uns tios que tiveram pique há coisa de três, quatro dêcadas atrás, não me parece muito são não.
Não, não mesmo. Eu já tô satisfeita, obrigada.

quarta-feira, fevereiro 15, 2006

Admirável mundo novo.

[Para o 17º Concurso Maldito, de tema Cosmogonia]

As pernas iam dobradas, a salientar um joelho que servia de apoio para as mãos. Pouca coisa acima, as coxas antecediam um corpo que se curvava prá acomodar-se ao pequeno espaço. E no que viria a ser o topo do todo, a cabeça encolhia-se em espera confortável.
Ali o tudo ainda era turvo, os sons ainda eram longe; esboços de melodias que, mais tarde, viriam a ser reconhecidas.
Aquela placidez confusa, contudo, dava sinais de sua finitude. As paredes pareciam raivosas ao comprimí-lo daquela maneira, ao tratá-lo como ferida com urgência de ser expurgada: não cabia mais.
Cabeça primeiro. Ombros, tronco, pernas e, por último, pés.
Neste recém universo era luz demais, era muito barulho, era frio que cortava-lhe a pele frágil e ele não sabia o que haveria de fazer.
Experimentou inspirar um pouco de ar com a boca, e estreou seus pulmões e estranhou sua nova vida e quis responder àquilo tudo.
Foi quando, sem surpreender a ninguém, contraiu a pequena face e chorou com a alma, pressentindo ingenuamente toda a vida que ainda iria caber naqueles, poucos centímetros, naquele tiquinho de quilos.

segunda-feira, fevereiro 13, 2006

Prá fazer inveja.

As costas doloridas e as mãos insinuando uma leve L.E.R nos tendões. Uma caneca suja de sorvete à esquerda; cd´s e uma placa que se encaixa eu sei lá onde no computador à direita. Pequeno caos. Já passava da hora de sair da frente do computador.
Dei um descanso prá cadeira e, ao passar pela porta, quase tropecei na gata, que, esparramada no chão, miava preguiçosamente como se pedisse, da forma menos exaltada possível, um carinho na barriga.
Mando-a procurar um serviço - carinhosamente, contudo - e continuo a descer as escadas.
Lá embaixo a rede, lá em cima o céu ficando rosa, era dia que findava. Brisa leve, tempo morno. Eu deitei-me e ociei.

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Porque esses dias eu, de fato, não tenho feito nada. Pensamentos sobre o ódio que eu dedico à Adriane Galisteu, sobre a quantidade de clipes de mano´s que mtv tem exibido, sobre como dias são diferentes quando se acorda bem depois do meio deles, sobre mil outras coisas insossas.
Estar de férias é bom.

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

The Dreamers.


[Ê vidão, hein fia? Ô leimcasa.]


Atores jovens (e bonitos), um pano de fundo a evocar alguma revolução e um relacionamento amoroso entre os personagens. Em um primeiro momento, o envolvimento de Mathew com os irmãos Theo e Isabelle, presente em Os Sonhadores, de Bertolucci, parece seguir a atual tendência dos filmes tidos sob a vergonhosa alcunha de cult-jovens, na qual também se encaixam os alemães The Edukators e Adeus Lênin.
Contudo, The Dreamers vai um pouco mais longe quando deixa de lado a abordagem jovem prá centrar-se no que compõe a parte talvez tida como cult do filme, ao trazer para os espectadores, referências a filmes clássicos das décadas de 30 e 40. E para que a maior parte do público não fique perdida, cenas das tais películas são inseridas na obra de Bertolucci, numa colagem que, apesar de conferir ao filme certo caráter didático, é um dos maiores trunfos deste.
Já a nudez e o sexo explícitos em Os Sonhadores são capazes de arrastar para o cinema muitos garotinhos com os hormônios à flor da pele. É fato que a sexualidade presente no filme proporciona algumas boas cenas - especialmente quando é apenas insinuada, ou contrasta com a casualidade - porém, soa gratuita na maior parte das vezes.
The Dreamers parece querer tratar de vários assuntos ao mesmo tempo - incesto, sexo, cinema, política, revolução - mas acaba por passar de forma superficial por todos estes. Vale, portanto, somente pela bela forma como é filmado, por certos diálogos, pela trilha sonora. No mais, soa apenas como um filme para cult´s inciantes, ou aprendizes de cinéfilos.

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[Eu sei que ninguém terá paciência, mas é que Rafael se perdeu com as argentinas. Então eu assisti ao filme e senti saudade das resenhas das aulas de "oficina de leitura e escrita". Era a única matéria que me agradava em jornalismo, fora fotografia. :~]

terça-feira, fevereiro 07, 2006

[Making Off - ou of?]

- temos que pensar o que levaria uma mulher a...
- deixa, lara. minhas mãos estão trêmulas. vou pegar meu caminho.
- amanhã terminamos este texto?
- amanhã dirá.
e ele nunca voltou pra casa
e ela olhava aquela página rabiscada
e ela chorava suas incompletudes
e ele se deitava com prostitutas argentinas
e ela se viu grávida
e ela jogou o bebe na lagoa da pampulha.
(terminaram, é fato)
(e com o feto)
(mortinho e boiando)
(fim)


[Filho acidental de Lara e Rafael numa noite sem poemas.]*
[Porque o "texto-com-enters", caso ele não se perca pros cantos argentinos, vem amanhã.]**
[Por hora, boa noite.]***

domingo, fevereiro 05, 2006

novo.

Finalmente, template novo.
Com meu microconto preferido, com fundo branco, com arquivos de três anos atrás - recomendáveis, caso queiram ver que adolescentes não são "miguxos" para sempre.
O dono da obra? O maldito mais querido.
Brigada, Rafa!
E prá abrir, esse aí que eu não sei se alguém entenderá.


[Três pra ti.]

Era grama de verde fresco roçando as minhas costas, e falta de preocupação com as formigas que, a essas alturas, já se entranhavam pelo meu cabelo a dentro. Céu branco de dia que acabara de nascer, lágrimas fazendo da minha alma vidro, aquela transparência frágil.
Anos poderiam ter se passado enquanto eu, silenciosamente, me virava do avesso a espera das tuas verdades, precisas. Vida e erros desfilaram na frente de nossos olhos ali, e os meus gritos de dor escorridos pelos olhos você limpou com a promessa de que outros erros virão, virão outros dias, outros cortes, outros amores.
Mas o tempo que passou foi apenas aquele necessário prá amanhecer um céu, prá se sarar uma alma, prá se perceber que "viver é muito perigoso", mas ter alguém que te distraia das lágrimas torna a travessia mais bonita.

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Passei, porra!

E não peço desculpas pelo mal vocabulário.
Que agora eu tremo e choro e não raciocino direito, mas o 55º lugar dos aprovados em Letras na Ufmg é meu! É meu diacho, é meu!
Felicidade assim, acho que desde um certo show do ano passado eu não sentia.
A minha modéstia eu mando a merda, e encho a boca prá dizer que tenho orgulho de mim. Orgulho de não ter me acomodado naquilo que eu não achava que fosse meu, e ter posto outro lado da minha face ao tapa.
O que vem pela frente eu já não sei, mas, por Deus, agora vai dar certo, se vai.

E prá festa sexta feira aqui em casa todo mundo é convidado!

sexta-feira, janeiro 27, 2006



"And you're standing here beside me
In a picture in a frame
And your voice could never fade it's so familiar
Things you said in my head
Every day..." [Cry]

The Sundays

Que sempre me faz invejar as paixões - as que matam e as que só doem - alheias.


[Prá lembrar da época de posts curtos e meus na madrugada.
Prá lembrar da sua época, menino que não volta mais.
Saudades.]

quarta-feira, janeiro 25, 2006

[Tentando me desenferrujar, rabisquei este pequeno para o 14º Concurso Maldito, de tema: Desmascarar.]

Falso.

Os assentos, alguns momentos antes ocupados com a catarse de quem ali postava-se, àquela hora já iam vagos. Iluminado pela lâmpada que pendia incerta do teto, o picadeiro se mostrava sob uma penumbra que, definitivamente, não caía bem ali. O vermelho-amarelo das lonas laterais dançava no chão sob um reflexo triste, decadente.
Era fim noite no Circo e era ainda rosto pintado em sorriso, bola vermelha no nariz.
O caminho para o banheiro ele já conhecia tão bem. E a sua imagem às vezes parecia nunca ter arredado pé daquele espelhinho retangular de bordas alaranjadas.
Lenço e água e fricção e a felicidade escorria pia abaixo.
Sem tinta no rosto, as sobrancelhas não mais se sustentavam no alto da cara; pendiam a solidão de quem, tal qual o circo, foi abandonado de súbito pela alegria.
Sumira o sorriso caricato nos lábios, lavado o batom; a boca era mais como um risco seco. Lábios finos que já não tem mais razão de se abrir.
A barba por fazer envolvendo a face lavada denunciava-o: um homem só, e só, a encarar-se a si mesmo no espelho fajuto daquele banheiro mínimo.

Mas se seus olhos obedeciam aos apertos da alma e lagrimavam seu reflexo, não havia porque se delongar na dor: A felicidade, esta jazia no picadeiro agora abandonado, e esperaria-o na noite seguinte, quieta e paciente dentro das tintas de sua maquiagem.

domingo, janeiro 15, 2006

"But there’s a full moon risin’
Let’s go dancin’ in the light
We know where the music’s playin’
Let’s go out and feel the night.
(...)
But now it’s gettin’ late
And the moon is climbin’ high
I want to celebrate
See it shinin’ in your eye.
Because I’m still in love with you
I want to see you dance again
Because I’m still in love with you
On this harvest moon."


Neil Young - Harvest Moon

(...)

[Harvest Moon seria um título muito óbvio?]

De súbito, a lua jorrava palidez ali, bem no centro do céu negro. E era como se toda ela interrompese a placidez contínua daquelas alturas com sua beleza. Confundia a calmaria quando esbanjava perfeição. Venenosa.
Cá embaixo, as tuas sandálias rotas faziam subir do chão o pó, fingiam ir prá voltar ao mesmo lugar, se conduziam com a leveza de quem não tem ao que obedecer. E era a tua palidez, cruel de tão bela, que interrompia minha noite fresca. Era a tua dança que sugava os meus sentidos, que reduzia-me a secura de boca e desespero de coração. Era eu menos que o pó que levantavas.
E a ouvir o reverberar de cordas dum violão, eu, que nunca me dei com estes passos que se dissimulam em ritmo, queria mais que tudo também saber me deixar levar. Você pelos sons; eu por você, neste tão longe tão perto que me põe besta e meio.
(...)
Param os sons, pára você. Debaixo do holofote lunar agora, só o rastro de poeira antes levantado, a voltar pro chão.
E eu, que me vejo despertado pelo silêncio, me deito com a tua ausência.
Que eu ainda sou um apaixonado, que quer ver-te dançar de novo.


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PS: Viajo prá praia hoje a noie. Volto dentro duns dez dias. Se eu não tiver paciência com lan houses, peço prá alguém atualizar isso aqui. Até!

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Língua Portuguesa e Literatura Brasileira
História
Inglês


Pronto. Finalmente, Férias Quae Sera Tamén.
Sobre os vestibulares, eu já me cansei de fazê-los e de falar sobre. Em suma, muito ônibus lotado, muito toc-toc-toc de pés no chão, muito período de sigilo e, agora, muita espera.
Prá mim, a volta prá Ipatinga amanhã. Um Neruda que não é meu prá ler, mais Guimarães Rosa e Jack Kerouack. Porque farofa pouca é bobagem.
Senti falta de escrever de fato [apesar de não saber o que isso significa realmente] aqui. Algumas idéias, contudo falta o tempo. Mas isso eu já resolvo.

E prá atualizar, aquilo que ele chamou de, Um pouco de Rafael, um pouco de Lara.

Crime
É igual feijão.
Bom é o feito em casa.

Erro
Trancou a família no banheiro
e engoliu a chave.

Cutelo
Pedacinho por pedacinho.
Feito como a fez murchar.

Engenho
Fez da mãe uma canoa.

Na panela
Coração de mãe,
Sempre cabe mais um.

Pena
Para o caçula virou o rosto.
O tiro só ouviu.

Veneno
Isso, amor... Come tudinho.

Improviso
A receita dizia dois quilos de carne.
O bebê tinha cinco.

Microondas
Lá dentro sorria. Bi bi bi!
Rosa, vermelho, roxo, explodiu.

Do vigésimo nono andar
- Voa, bebezinho, voa!

Perfeito
...e agora você é meu álibi. Porque quer teu sangue correndo nas veias, né?

Fria leitura
Matou a família e foi ler micro-contos.

segunda-feira, janeiro 09, 2006

Redação

Um alarme mais barulhento que todos os outros tocando quando eu finalmente tinha deixado a ansiedade de lado prá pegar no sono. E daí até dormir outra vez, lá se foram uns trinta minutos. Mas consegui acordar e me arrumar prá meter-me num ônibus que, por Deus, jurei que não me caberia. Caixa abarrotada de gente - grande novidade - e Kelly Key tocando na rádio. Sabe que é mais constrangedor quando há gente perto? É... principalmente na parte em que ela fala "Só porque cê tá de carro?". A vergonha era tão grande que deu vontade de pular pela janela.
Enfim. A sala com doze carteiras me lembrou sonho, não sei porque. Tão pequena, tão tranquila, era clara. E finalmente aquelas enjoadas questões dissertativas, um manifesto contra a violência [faz-me rir!] e um "texto a ser publicado num jornal de grande circulação." [Ironia do destino? Sei que me desfiz dos conceitos de lead e tudo mais. Afinal, é disso que eu corro.].
A Carta de Caminha me foi gentil. Também o Capitão Rodrigo do Veríssimo [o Érico, querido.] e os tais Contos Amazônicos. Mas, Guimarães Rosa, o senhor pisou no meu calo com o/a Diadorim e o Riobaldo na travessia. Inventar é a solução, e juro que fez até sentido. Mas esses corretores da banca... eu não sei se me compreendem.
Na volta teve o centro quente dessa cidade, numa tarde quente, sob a ótica dumas lentes escuras. E eu concluí que gosto daquele monte de gente atravessando prá lá e prá cá e dos carros quase me matando na minha travessia. Tanto quanto gosto dos exageros.

Então amanhã tem mais. Provavelmente contarei às paredes, novamente, como é que foi.