terça-feira, dezembro 27, 2005

[*Cronch* Senta que lá vem história.]

É fato que há um certo atraso nesse post de fim de ano, mas acontece que, não sei se por falta de tempo ou de ânimo, mas deixei passar o natal sem desejar, algo de bom prá quem quer que seja que visite isso aqui.
Então não vou desejar, porque isso soaria tão patético quanto luzes de natal na janela em pleno Março, ou Jingle Bells como toque de celular em Abril. [Juro que já ouvi falar de um cara que usava esse ringtone durante todo um ano.]
O que interessa é que três dias e poucas horas de 2005 é o que ainda me resta desse ano, e penso ser inevitável não tecer nenhuma reflexão a respeito desses dias que ficaram prá trás.

Talvez lembrar.
Que eu comecei sem saber onde ia terminar, como qualquer pessoa. Que, quando eu soube mais ou menos onde é que eu iria me enfiar, eu senti um medo tão grande que temi molhar as calças. Que eu percebi que escrever leads e apurar matérias não era bem o que eu queria prá mim, e tentei - ainda tento* - dar jeito nisso. Que amarguei dias de "eu-queria-que-fosse-como-antes", encharcando travesseiros e estranhando quando me pegavam pela mão - ora essa, eram mãos diferentes, viu!
Que aprendi a andar em ruas estranhas e a desconfiar da cara de qualquer pessoa que não tivesse asas nas costas, ou auréolas sob as cabeças [apesar de que, não me engano, houve horas em que até estes eu olhei de solsaio e medi de cima a baixo].
Talvez sorrir.
Que eu vi meu rosto queimar de vergonha, engoli palavras e senti a saudade me cortar o peito, como se eu parisse ou arrumasse o quarto de meu filho morto umas trinta vezes por dia, mas percebi que tudo isso me valeu de alguma coisa, já que eu ainda prefiro olhar pro chão, mas se preciso sei olhar na altura dos teus olhos. [Acho que chamam a isso de confiança, mas não é certeza]. Que eu conheci John Fante e Clarice Lispector e quis, finalmente, ser alguma coisa da minha vida - não que eu realmente vá, não que eu tenha o cacife; é apenas querer. Que agora eu não só estendo as mãos àquelas palmas outrora estranhas, como consigo me apoiar nas antigas conhecidas. Que eu realizei, talvez pela primeira vez em minha vida, um sonho guardado há anos, e senti e o meu peito quase se arrebentar de tanta felicidade. Pearl Jam.
Talvez concluir.
Que projetos de ano novo são besteira, e que o ano que virá me baterá numa face e beijará a outra logo depois, como todos os anteriores. Que o que importa, sobretudo, é o que se carrega de tudo o que se viveu, ou de tudo que te deixaram viver.

Porém, só prá não perder o costume: Ô 2006, cê dê um jeito de ser bom viu, marmota.
E não só prá mim, é claro. :)


[The Verve - Bittersweet Simphony]

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*Quanto a ainda tentar... Nove, dez, onze e doze de Janeiro são as minhas provas de vestibular. Letras na UFMG, amiguinhos. Se der certo, vai dar certo. Vocês torçam, que eu vou sumir daqui e tentar enfiar história na minha cabeça nos próximos dias.
Até!

quinta-feira, dezembro 22, 2005

[Pro 10º Concurso Maldito, de tema: Decadência.]

Mise en Abyme

Demoro-me um pouco a largar a cama hoje. Mais que o pavor de enfrentar o frio que deve fazer fora do edredon, eu quero prolongar este estado gostoso de quase realidade em que me encontro. Sonho lucidamente, com ânsia de desfrutar todas as minhas ilusões adormecidas, porque sei que não tarda e eu escutarei o pí pí pí do despertador entrar dentro dos meus miolos, e trazer-me da forma mais cruel possível ao meu cotidiano.
Um contratempo em meus devaneios sonâmbulos desperta-me por completo, e, ainda meio confuso, vejo o teto tomar forma acima de mim. Aquele lustre sem graça a proteger a lâmpada apagada, algumas falhas na pintura; infiltrações.
É estranho mas posso ver-me ali, bem ali no teto; o sono fazendo-me débil, as mãos estapeando o pobre relógio prá que ele pare com aquela cantoria matinal irritante. Coço os olhos, bocejo - e que diabo de boca grande eu tenho, cruzes - e levanto finalmente. Arrasto-me ao banheiro e do banheiro até a cozinha, até o café quente descendo e queimando a goela e o pão esfarelando-se sob minha camisa. É manhã.
Caminho, irritado com a gravata apertada no pescoço, até o ponto de ônibus, e espero minutos que em minha cabeça transformam-se em horas maçantes, de gente chata sorrindo bom humor matinal e comentando sobre o tempo. Sinto ódio, sinto pressa, sinto repulsa, pena de mim, e ódio outra vez. Todo aquele trajeto que se faz tão mesmo prá mim todos as manhãs. As pessoas que me inspiram pensamentos iguais, dia após dia. A porta do escritório, nunca diferente. O tocar do telefone de que eu me recordo tão bem, meus atos que em nada me surpreendem, meus aborrecimentos de causa sempre mesma. Fins de expediente marcados por frases mecânicas, já gravadas em minha cabeça. E a volta prá casa, a gravata que me incomoda, as pessoas que riem cansaço, a minha irritação. A porta de casa, nunca diferente. O barulho da t.v e aqueles rostos, oh céus, saídos duma fábrica de produção em série. Meus olhos ardendo sono quando ainda estou no sofá, me indicam que tenho só o tempo suficiente para trocar a roupa e ajeitar-me na cama, antes que o sistema desligue-se automaticamente. Sei que não tarda e eu escutarei o pí pí pí do despertador entrar dentro dos meus miolos, e trazer-me da forma mais cruel possível ao meu cotidiano.
Inevitavelmente penso no tempo que escorre por entre esses meus dias, que se colocados frente a frente, refletiriam-se sem ruído algum; feito espelhos.
Procuro em agonia, por entre aquelas manchinhas de reboco mal feito, aquilo que roubou de mim o que um dia eu tive de essencial. Eu quero a resposta prá minha pergunta e um remédio prá dar jeito nessa minha decadência, que se afirma na estaticidade das coisas. Porque enquanto tudo vai sob controle e nada de novo acontece, eu vejo a minha vida descer, degrau por degrau, essa escada insossa da mediocridade, e sinto a idade querer me pesar a consciência. Que me deram uma vida a ser escrita, e dela eu fiz uma folha em branco, tão significativa quanto este teto de apartamento alugado, que agora me fita em acusação crescente e me faz querer ver despencar toda essa imensidão alva sob a lacuna que eu sou.

Mas o relógio precipita-se, e inicia sua cantoria matinal irritante. Eu coço os olhos, bocejo, e levanto finalmente.

sábado, dezembro 17, 2005

LOSING MY EDGE.

Com música, prá tentar desvanecer o tédio que esse fim de sábado me propõe.
E ainda sentindo na ponta da língua o gosto roxo que dança entre o não-doce e o amargo; este vinho que sujou a taça agora há pouco, pose. Pose sim, que esta menina tentando segurar a taça direito, fingindo apreciar as nuances que se transmutam naquele líquido, não sou eu.
Estou mais para aquela que se tortura com a própria preguiça, que sabe de tudo que pode deixar de ganhar por pura apatia. Sou aquela que se afirma no que deixa passar, que faz dos erros bandeiras, e ainda assim olha com cara feia pro [auto]rótulo de vítima. Aquilo que dança por entre cordas já mais que bambas, e salta dum extremo ao outro, sem procurar fixar-se em nenhum deles.
Lagriminhas que não são limpadas dos olhos que vêem aquele casal a saltar na neve, uns cabelos azuis a dançar num vento frio, após a conclusão de que, apagar da mente é inútil, quando o coração se repete até o cansaço, até o sofrimento mais insustentável. Sou choro incontido em filmes que falam de Brilhos Eternos e Mentes sem lembranças.
E sou piedade e relativismo hipócritas, explícitos num ranço que mescla contestação e auto-educação. Aqueles tiros que antecedem os créditos, destruidores mas ainda assim não fortes o bastante prá demonstrar o ódio recém descoberto perante àquela Vila de Cachorros.
Voz que fala às paredes, voz que se veste de outros trajes prá não se expor totalmente, voz que se reserva exacerbadamente por motivos que eu mesma desconheço.

Sou egocentrismo, sou umbiguismo. Sou pretensão de encher linhas e linhas com um assunto que, nem a mim interessa verdadeiramente.
Falar de si por falta do que falar.
Falar de si prá falar de algo que [erroneamente] julga-se conhecer por completo.






[É isso, ou podemos todos dançar lambada na frente do computador.]

segunda-feira, dezembro 12, 2005

[9º Concurso Maldito (é, da outra vez eu me enganei. O último foi o oitavo.). Tema: Desigualdade Social]

Gente.

De minha altura, que certamente prá alguns ultrapassa os meus precisos cento e setenta e três centímetros, essas pessoas me parecem diminuídas. Como se o sofrimento que elas carregam sob as costas fosse tão grande que, aos poucos, os joelhos se curvariam ao peso do martírio e as cabeças inclinariam-se ao chão, denunciando que orgulho ali já não existe; perdeu-se nas esquinas sujas, nas mãos estendidas, nos furtos, nas fomes.
Quando meus cílios pesados de rímel deixam meus olhos abertos, eu vejo olhos cinzas nos rostos dessas pessoas. Vejo uns olhos que parecem pedir desculpa pelo que ainda não foi feito, uns olhos que passeam por todo o meu redor mas nunca miram minhas pupilas diretamente. Eu vejo lágrimas contidas, que, por estarem ali há tanto tempo, acostumaram-se à idéia de nunca irromperem os limites das pálpebras, e congelaram-se, tornando turva a visão e opaco o olhar.
Minhas mãos lisas, que não sabem manusear nada além de canetas e lápis, parecem ofender a aspereza daquelas palmas calejadas, de quem já fez de tudo um pouco e não pôde se dar ao luxo de indagar-se se aquilo ali dava-lhe prazer. Costas de mãos já salgadas de tanto limpar suor de testas, unhas sujas de trabalho e ainda assim, mãos que se postam em oração, prá agradecer o que não há, e suplicar, implorar, mendigar pelo que nunca deveria ter faltado.


Não são só corpos sujos, olhos baixos de vagabundo que não quer trabalhar, mãos ásperas que atrapalham um passeio quando se esticam em pedido. Não são só uma pedra atirada à sua redoma de vidro, ameaçando quebrar sua estabilidade ricamente construída; são corpos, são olhos, são mãos, são, sobretudo, pessoas, injustamente já tão afundadas em desespero, ausência, dor e desgraça.

sábado, dezembro 10, 2005

[Atrasada pro 9º Concurso Maldito, de tema: Contos Malditos.]

Ironia

Clamou pelo pai de todos que estava no céu, e disse ser santo o nome deste. Quis que as alturas descessem, e que fosse feita a sua vontade cá e lá.Como se fosse pouco, ainda pediu o alimento cotidiano, o perdão de suas, também usuais falhas - que pecados ele não acreditava ter - e a proteção contra males e tentações.
Terminou com um Amém, cujo significado desconhecia, apanhou o casaco deixado na cadeira noite passada e saiu; porta afora, madrugada adentro.
Enquanto caminhava, os braços tocando a si mesmos prá remediar o frio, e a cabeça mirando hora o sapato esquerdo, hora o direito, recordava-se de detalhes do serviço que fora-lhe encomendado: "Último ponto da Rua dos Rubros, homem de 47 anos; pele clara, calvo e baixinho. Usando o uniforme da Usina, saltará no Ònibus das três e trinta. Sozinho."
Parecia fácil, em trabalhos assim não era estreante.
Sabia que bastava fazer-se discreto, contar com a ausência de gente que, àquela hora, haveria na rua, e dar graças ao silenciador que tinha em seu revólver.
As passadas firmes ecoavam pela rua, e a frieza de sua alma parecia confrontar-se com a da madrugada. Tinha o semblante tão tranquilo que, não fosse o silêncio que exigia a operação, poderia assoviar.
Havia chegado a seu destino e aproveitou o tronco grosso duma árvore para esconder-se enquanto o ônibus não aparecia por ali, pronto a cuspir pela última vez seu último passageiro.
Segundos depois, o automóvel barulhento e desengonçado fez sua parada final e seguiu rumo à garagem. O homem baixinho saltou como fazia todas as noites, e deixou-se ser ouvido a caminhar sua mesmice cotidiana. Foi a gingar seu corpinho gordo pela calçada, até dar as costas à mira da arma cuja existência desconhcia. Poucas passadas depois, beijou o chão e sangrou pela cabeça.
O dono do disparo já julgava ter cumprido sua missão quando, aos poucos, sentiu o coração descarnar-se de seu corpo. Os ombros pesavam como se ostentassem um piano, e o seu existir ia se apequenando de tal forma, que ele temeu perdê-lo.
Experimentava culpa pela priveira vez na vida, e não podia entender o porque. Se tantas outras vezes já puxara gatilhos e findara existências, não havia motivo prá, agora, ver-se às voltas com toda aquela angústia.
Caminhou até sua vítima numa tentativa inconsciente de buscar, não respostas, e sim mais martírio. Com a ponta dos sapatos, que agora já iam manchados de vermelho escuro, virou as costas do morto para o chão, afim de observar-lhe o rosto.
Sentiu o que ainda lhe sobrara de alma congelar-se, quando reconheceu naquele rosto sem vida traços seus. E amaldiçoou a névoa que a madrugada trazia e a estúpida distância que fora grande o bastante prá confundir-lhe as vistas; mas não o suficiente prá evitar que ele fosse, agora, assassino de seu próprio pai.
"Assassino de meu próprio pai. Assassino de meu próprio pai."
Repetia incessantemente enquanto dobrava-se incrédulo sob os joelhos.
Embasbacado ainda, e tentando livrar-se da insanidade momentânea que ameaçava tomar-lhe, Édipo, em nome do corpo desencarnado à sua frente, Clamou pelo pai de todos que estava no céu, e disse ser santo o nome deste. Quis que as alturas descessem, e que...


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[Notas egocêntricas.]

E, ó.
Eu bem disse que não ia tentar descrever tecnicamente o Show do Pearl Jam.
Mas ainda há uma coisinha jornalística dentro de mim, e eu acabei escrevendo o que talvez, com muita boa vontade, poderiam chamar de resenha.
Uns caracteres a menos, e fundida com o texto duma garota que também foi comigo prá Curitiba, aqui está.
É até curioso ver meu nome assinando outra coisa que não sejam posts nesse blog.
Curioso do jeito bom. :)

E ahhhh! [má que saco, hein Lara?]
Passei prá segunda etapa do vestibular.
E se passo da segunda, ano que vem serei estudante de Letras. :)

E poxa! [inconha! ¬¬]
Hoje é sábado. De notícias boas.
Começo a ficar alegre.
Bom fim de semana, ô gente. :)

segunda-feira, dezembro 05, 2005

Felicidade quando arrancam da gente assim dá raiva, sabe.
Fica-se mais triste pela ausência súbita dela, que pela tristeza do fato propriamente dito.
Dá ódio, na verdade. Muito ódio de ver que alegria é coisa tão, assim, efêmera.
Mas, faz bem saber que há lembranças, e que à elas eu posso me agarrar com a confiança duma criança nos braços de mãe.

Essas vocês não vão diminuir.

[Amanhã deve vir um post de verdade.]

quinta-feira, dezembro 01, 2005

Aqui jaz uma foto de Eddie Vedder, que desalinhou meu template.
[Mr. Eddie Vedder ontem, comprovando aquela história do rei que nunca perde a majestade. E a foto vai enorme mesmo - é merecido.]
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[Sobre Sonhos.]

Ah.
Eu poderia chegar aqui e descrever tecnicamente tudo aquilo que eu vi e ouvi ontem, em Curitiba. Mas, acontece que isso não levaria vocês prá lá. Isso não esmagaria as pernas de vocês de dor; não colaria teus estômagos nas costas; não faria vocês esquecerem de fome, de desconforto, de calor, e de que existia um mundo fora daquele espaço ali em que o show acontecia.
E é por isso que eu não vou tentar reproduzir aquilo tudo com palavras. Só me limito a dizer que o Show do Pearl Jam foi a melhor coisa que eu já presenciei. Sem medo algum de estar equivocada.
Não era coisa de se ver, ou de se ouvir; Aquilo ali era prá ser sentido, vivido com a intensidade que se fez a tua espera durante todo o tempo que eles demoraram.
Eu, naquelas duas horas e meia de show, superei todos os meus limites e descobri que sonhos se realizam num misto de dor e prazer, lágrima e suor, felicidade e êxtase.
Ver na minha frente a banda que não sei por quais motivos se tornou a minha preferida, ouvir aqueles cinco rapazes tocando prá mim [e que importa se não era exclusivamente prá mim?], sentir que eu ainda estou viva, que eu não desaprendi a sentir paixão pelas coisas, é coisa que não se explica, porque é coisa que não se entende.
Foi maravilhoso, se interessa a alguém. Foi simplesmente maravilhoso.

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segunda-feira, novembro 28, 2005

Então.
Amanhã é dia de entrar no ônibus com gente que eu ainda nem conheço e adormecer minha bunda com mais de quinze horas de viagem até amanhecer em Curitiba. Mas aí quarta feira não vai ter torcicolo nem bunda doendo nem fome nem qualquer outra menor necessidade fisiológica que me tire daquela Pedreira, que desgrude meus olhinhos do palco.
O Pearl Jam, sô. O Pearl Jam.
E quando eu voltar, conto como é que tudo foi maravilhoso.

Por enquanto mesmo, só uma daquelas besteiras riscadas na horizontal, ó:


[Sem título porque a ansiedade já me come.]

Chegou embriagado em casa. Era a terceira vez naquela semana. Contudo, pessoa para censurá-lo não havia; Morava e vivia sozinho.
Cambaleou da sala até o quarto, onde desfez-se dos sapatos. Sentado na cama, os olhos vermelhos e molhados passeavam pela paisagem urbana que a janela do sétimo andar deixava ver. Outros prédios, e mais cinza, e concreto.
Desistiu de caçar lógicar naquilo ali, também porque começara a sentir-se nauseado. Olhou pros pés e viu a mancha rosa que, na juventudade, durante poucos minutos fora seu câncer. Aquele que foi suspeita e consequente negação dos médicos em menos de uma hora. A lembrança enfureceu-lhe. Mas que desgraça, nem um cancerzinho de merda deixavam-lhe ter. Nada que fizesse-lhe pelo menos um pouco diferente.
Voltou os olhos para seu guarda roupa de mongo, três portas, três calças, três gravadas, duas camisas, um chinelo, três parcelas a serem pagas, que dançava na frente de seus olhos. E aquele quadro "deus-é-fiel" comprado no Um e Noventa e Nove também teimava em não aquietar-se.
O enjôo lhe ia crescendo, que era vileza demais que era sozinhês demais e pequenez nem se fala o futuro promissor onde é que ficara e as boas notas do colegial os amigos que um dia tivera e tudo atacava-lhe o rosto como faces que riem e dedos que apontam sentia faltar-lhe o ar até quando é que aguentaria até que...
De súbito, virou-se pro lado e vomitou a alma.

sexta-feira, novembro 25, 2005

Há um certo tempo, eu não saberia precisar quanto, eu tento me esconder da minha mediocridade. Ponho nos olhos uma venda feita de orgulho besta e cubro o corpo com ilusões.
Mas ontem, a maldita me encarou. Sentou-se na minha frente na mesa do bar, bebeu cerveja no meu copo, enfiou o dedo na minha cara, apontou as não-saídas dos becos.
Mais cruel que um espelho, ela me refletiu, destituída das mentiras nas quais eu me apoiei prá esquivar-me dela. E aí, todas as desculpas e justificativas não tinham mais serventia alguma prá mim.
Ela me disse que agora, e sempre, seríamos eu e ela e ela e eu, e que eu não tentasse não; escape não haveria nunca.
Eu entendi, entendi sim. E dei uma olhada ao meu redor prá perceber que todos viviam felizes na sua vileza, sorrindo simpatias fingidas, almejando a calça mais cara da vitrine da esquina.
"Pois bem. Se eles podem, porque não eu?", foi o que eu pensei.
Então foi só erguer o copo e brindar com minha amiga de tantos anos [passados e futuros] a felicidade de plástico que eu ainda hei de viver.


[Ouvindo Travis - Love you anyways.]

PS: Estou de férias. U-au.

domingo, novembro 20, 2005

Presentes de natal, filme, vergonha alheia. Enfim, coisas de domingo. [Não, missa não tem não.]



Velvet Goldmine é o tipo de filme que todo mundo vê e gosta mais pelas referências contidas na história do que pela produção do filme em si. Pelo menos foi essa a impressão que eu tive depois das duas horas e pouquinho de trilha sonora boa e sotaque britânico que eu assisti hoje.
Tá que isso que eu disse pode ficar meio confuso prá quem não sabe bem qual é o contexto do filme. Basicamente, é a história da cena glam rock na inglaterra, lá pelos anos 70, contada, porém, com personagens fictícios escancaradamente inspirados em ícones reais da época. A foto em questão não deixa tão claro, mas, o rapazinho da esquerda, no filme é Brian Slade. Contudo, se você o vir com o cabelo azul e jaqueta prateada, põe sua mãe [é, a mãe mesmo] no fogo se ele não é o David Bowie. E o junkzinho da direita, interpretado pelo Ewan McGregor, é Curt Wild no filme. Mas desde o momento em que ele entra em cena, de calça de couro preta agarradinha, lápis nos olhos e as costas encurvadas prá frente, você percebe que ele é Iggy Pop.
Basicamente os dois tem um caso, se drogam, fazem sucesso e protagonizam cenas absurdamente constrangedoras. Eu não minto se digo que enfiei a cara no travesseiro quando vi os dois rodando, cantando Sattelite of Love do Lou Reed com o olhar apaixonado um no outro, entre luzes coloridinhas.
Enfim. Velvet Goldmine é um filme interessante na medida em que traduz para o cinema a cena musical de algumas décadas atrás. [Por sinal, a década que abre o livro Mate-me por favor, se não me engano.] Mas, como produção artística mesmo, eu acho que deixa muito a desejar.


Ah, sim. O presente de natal.

[Eu sei, papai noel, que eu não fui lá a melhor garota do mundo durante esse ano. Eu sei até que cometi umas burradas que, poxa vida, né. Acontece que, por elas, eu mesma fiz questão de me punir. E você sabe que eu sou minha melhor carrasca né?
Pois então. Tenho as minhas dívidas sanadas. Não custa atender o meu pedido.
Traz prá mim, o Ewan McGregor vestido de Iggy Pop [sem as viadagens, óbvio.] no dia 24 que eu prometo, juro, que ano que vem vou ser boa menina.
Fechou?
]

quarta-feira, novembro 16, 2005

[Para o sétimo Concurso Maldito. O tema era algo como "ganhar na loteria".]

Prá [não] ver a vida passar

Prá ela não fazia muita diferença se era dia dos claros ou dos cinzas. E se era feriado ou segunda feira, ela também não tinha urgência de saber. É que ali da janela as coisas não se modificavam muito não...
Todo o dia, depois da sesta, ela deixava o marido a dormir na cama e caminhava até o parapeito. E naquele horário em que tudo já ia fresco e definido, a rua deixava ver passarem os carros, as mocinhas, os homens, as bicicletas, as crianças correndo com os chinelos na mão.
Não, não ficava ali a observar realmente tudo o que sucedia. Era mais como um descanso pros olhos, uma forma de dar vazão a seus pensamentos, agora já mais ou menos gastos, que os anos que ela carregava nas costas não caberiam nas mãos de sete pessoas.
E foi num dia desses, de janela, coisas passando e horas da tarde, que ela percebeu voltar lá do outro lado da esquina o seu marido, correndo como deixava a idade, sorrindo como não se via há muito tempo. Tinha um bilhetinho na mão, que sacudia pro ar, como se quissesse mostrar ao mundo [que, prá ele, bem verdade, não passava muito daquela rua] que aquele papel era seu e que agora ninguém o tiraria de suas garras.
Com névoa de devaneios pelo rosto, ela foi até a porta ver o que é que ocorria com o seu velho e quase que não entendeu o que ele explicava com gestos, gritos e uns beijos desajeitados que dava em seu rosto esporadicamente. Então era isso... haviam ganhado na loteria, e estavam ricos, e aquela casa chique, dois pavimentos, bairro bom, viria já já. E as dívidas do filho mais novo seriam sanadas, iam ver o Roberto Carlos naquela viagem de navio que passava pela tv, e, por falar em tv, iam trocar. Uma nova, grandona, parede quase inteira, ia encher a sala.
E com todo aquele excesso de informação, de novidade, de mudanças, ela só soube se confundir. Deixou que o marido resolvesse tudo, até que as coisas tomassem seu rumo, que aquilo ali ela iria só assitir.
No segundo andar duma casa luxuosa, naquele bairro onde moram os membros da alta sociedade, ela perde o olhar na janela todos os dias, após a sesta. Seu marido dorme e ela pensa, divaga, viaja.
Mas agora [não] vê topos de cabeças e tetos de carro. É que a casa é alta, e em seus pés botaram uns saltos altos.

segunda-feira, novembro 14, 2005

Ha.


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Bah.
Passa que lá é estranho e aqui é esquisito. E no outro lugar então, deus do céu. A vontade única era a de ser tão pequena quanto eu me sentia.
Descobri, depois de horas sem dormir e estrada asfalto sol e banco de carros, que o lugar em que eu caibo é o caminho.
Vestida de ansiedade prá chegada, afogada em "mas dessa vez vai ser bom, vai sim."
Passa que eu caibo nas lembranças. Minhas e alheias.
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"Waiting for the miracle... For the miracle to come."

terça-feira, novembro 08, 2005

[QuintoConcurso Maldito. O tema dessa vez era "Clichê".]

Daqueles papos originais que a gente ouve na fila do pão. (Ou no corredor da faculdade, no ponto de ônibus, na mesa ao lado.)


Daí né, daí o morro era alto prá caramba né, mó subidaça assim né, e o sol bicho, nem te conto daquele sol. Puta sol quente do caralho, arregaçando meus miolo. Coloquei a mão na cabeça e muleque, tu num acredita. Não, tu num leva fé no quanto que tava quente a parada.
Poizintão. Mas aí eu tava subindo aquele trem, e começou a chegar uns malaco muito estranho perto de mim. Também né, eu com essa cara lindona de playboy que eu tenho né, ha-ha fala aí amizade, fala aí se num é, fala sério, pô. Então. Veio chegano mais prá perto os mulequinho assim e eu pensei que ia rodar né, claro né. Porque tava até meio arrumado assim, não fragava dos esquema ainda, daí fui do jeito que achava que dava certo e tal. Os moleque bicho, com trintêoito na mão, tudo assim ó, tudo passando perdimim e eu lá, só na minha. Vô encará não né? Cê besta. Vai que cismam comigo e vem prá cima de mim aí eu tô ferrado né? Ha. Aí fui, fui na minha assim, na moral, suando que nem um porco ou, tu precisava ver.
Com pôco cheguei lá na boca né. Daí mandei chamá aquele cara que o Bunda me deu o nome. (...) O Bunda, porra. Aquele do segundo ano. É, o bundudo, claro né, ô oreia. Então, (...) não, fica quieto! Escuta a parada! Veio o sujeito né. Bicho, mais mal encarado que o capeta, ou. Nessa hora eu, eu nem queria falá não viu, mas confessá procê que é brother. Nessa hora eu tremi nas base. Aí pedi né, passei o dinheiro prá ele e ele veio com a minha trouxinha.
Ah menino, nem acreditei direito na hora que vi o negócio. Dei um jeito discondê assim, coloquei por dentro do tênis, embaixo do amortecedor sacolé? Haha, eu tenho a manha, muleque. Eu tô te falando que tenho. E aí vim descendo prá cá... No caminho bicho, inda cruzei com um puliça, cê acredita? Fiquei até com um medo de rodar, mas aí ele passou por mim de boa assim, nem desconfiou nem nada, nem nada. (...) Aliiii muleque, ali do outro lado da rua. Tá vendo não? Aquela menina gostóóósa que vai lá na loja da mãe vezenquando. Ô, mulher boa viu. Uma dessa comigo num dura nem dois segundo. (...) Ah tá. Mas e aí, vamo? (...) Coééé frango! Vai amarelar agora? Ahhh não me decepciona não sô! (...) Que mané descobrir! Descobrir! É só você num dá bandeira. Vão bora, vão. Anda logo. Vô enrolar prá gente que nós vamo tudo ficar doidão. Ha-ha, loucuuuura bicho, loucuuuura demais.
Chega aí, fei.

sábado, novembro 05, 2005

Prá Justificar um Micro-Conto

Anda não era muito tarde, mas o céu já ia escuro. Findava um daqueles dias cinzas de verão, em que sombinhas escapam das bolsas prevendo chuva. Chuva... tinha disso também. É, por sinal, chovia.
Lá na frente se deixava ver a garota, pisando os paralelepípedos com tanta calma que, não fosse pelo vestido amarelo molhado, poderia-se afirmar, com a certeza da fé d´um crente, que os pingos da chuva não a atingiam.
O tal vestidinho era novo. Comprado no brechó há uma semana. Corte reto. Um palmo aberto acima do joelho e lá estava a barra. Manguinhas no meio do braço e uma golinha simpática. Bonitinho que só ele.
As sapatilhas brancas ela segurava nas mãos, prá sentir com a planta dos pés o frio do chão molhado. Era bom.
Por um instante, parou e mirou o poste aceso. Via as gotas a passar agitadas rente ao medalhão de luz que a lâmpada formava, e se enchia duma inquietação diferente. Sentia que algo subia-lhe pelo estômago e parecia prestes a tomá-la de súbito.
Conseguiria resistir? A rua parecia tão bonita assim, sob luzes de postes, fechada por árvores molhadas, se enchendo de música da chuva. E... havia porque resistir?
Largou os sapatos no chão e abriu os braços. Os olhos bem fechados, a cbeça inclinada prá trás, um sorriso no rosto.
Era ali um sopro amarelo arrombando a sobriedade das janelas que se fechavam para a rua.
Girava feito criança, então não poderia gargalhar de outra forma. Girava e que se dane se ele não a amava, à merda com os estudos atrasados, um foda-se à sua crise existêncial e que vão pro inferno os famintos da Somália.
Girava agora, como se sua alma pesasse menos que uma pena. Girou até arfar de cansaço e se deixar cair no chão, as mãos na barriga que chacoalhava enquanto ela ria.
E assim foi.

Foi feliz e, em seguida, foi prá casa.



[Enquanto eu escrevia isso começou a chover de verdade lá fora. Sopraram felicidade na minha cara também. Eu só não vestia amarelo. :)]

quarta-feira, novembro 02, 2005

Always, The Hours.

Always, The Hours.

[ "Dear Leonard, To look life in the face, always, to look life in the face, and to know it for what it is. At last to know it, to love it, for what it is, and then, to put it away. Leonard, always the years between us, always the years, always the love, always... the hours..." ]


Mrs. Dalloway disse que ela mesma iria comprar as flores hoje.
Virginia Woolf perdida em seus devaneios de escritora, matando e ressucitando sua heroína. Tirando a vida do poeta visionário prá que os outros dêem mais valor ao que têm ao seu redor. Mergulhando em rios com pedras nos bolsos do casaco.
Clarissa reprimindo seu choro rasgado com festas convites comidas cadeiras flores - que ela mesma comprou. Clarissa sucumbindo à sua dor na frente do fogão, limpando as lágrimas com as costas da mão, que a palma já ia suja de comida que ela preparava pro jantar de mais tarde. Clarissa apoiando sua vida em quem, com olhos tristes dum azul bonito, se joga pela janela após um "eu te amo".
A música do piano ficando mais intensa, as teclas da parte esquerda sendo surradas em acordes graves, cortantemente harmonizadas com o som de notas agudas. Réquiem prum corpo que já não mais tem de de encarar as horas.
Laura chorando escondida no banheiro a tristeza de não conseguir ser menos fria. Deixando romperem as lágrimas que a avisam que, daquele jeito ali não dá prá ser. Que felicidade não é prá ela. Laura que faz um bolo prá mostrar ao seu marido que o ama, e deixa seu filho numa creche prá se entupir de pílulas branquinhas que a livrariam do peso de viver.
E eu ainda tenho que encarar as horas. Aquelas que sucedem e antecedem momentos que, ingênua como só cabe a uma moça ser, julgo serem o início da felicidade quando, na verdade, são só um sopro dela.
Sobem os créditos e eu vejo no escuro do fundo da tela uma menina encolhida no sofá com os cabelos despenteados. O travesseiro amassado entre as pernas e o corpo. A boca abafando choros na fronha alva.

[Quando um filme parece ter sido feito com o extrato dos miolos da sua cabeça, ele não acaba com a última cena. Hoje, nesse feriado cinza, eu assisti "As Horas".]

sábado, outubro 29, 2005

[Mais um pro Concurso Maldito. O tema dessa vez era Atos Carnais. Ui.]


Sintético.

O som das chicotadas ressoava pelo eco monstro da igreja. Parecia tão alto que faria enrrugar de pavor o rosto daqueles santos do altar, não fossem eles tão apáticos.
Os caroços rígidos de milho comiam-lhe a pele dos joelhos como se tivessem dentes; agarravam-se a ela como se ostentassem garras; queriam penetrar carne adentro como se estar ali fora fosse erro com urgência de ser sanado.
Concentrava-se na dor prá se esquecer do ambiente a sua volta. Assim não veria os rostos de gesso que o culpavam e não sentiria em seu corpo o cheiro da batina rançosa e puída que afirmava: Era um padre.
Era um padre e era um padre e era o Deus lá da paróquia e era homem e era carne, e desejo, o celibato, as mulheres, e ai há Deus, e era um padre.
O suor lhe escorria pelas costas e ele urrava de dor que provocava a si mesmo. Ainda assim não conseguia se esquivar daquilo a que todo ser de sangue nas veias sucumbe. Porque suava e, sexo. Porque gemia e, sexo. Porque era intenso e, sexo. Os lábios da santa e, sexo.
E parecia até o estalar do chicote em sua pele cantar "sexo!".
Bocas e pernas e o decote da beata, aquela mocinha que outro dia passou assim, sorrindo com os olhos em brasa.
Envolveu-se em pensamentos e devaneios proibidos, numa catarse tão intensa que já não ouvia o som das chicotadas, tampouco sentia os grãos furarem-lhe os joelhos.
Em sua frente agora, só uma silhueta feminina. Um vestido sem cor e sem forma se afrouxava no corpo da mulher à medida em que suas mãos tiravam das casas botões sem textura.
Não tinha rosto, a sua fêmea. Era só sexo e unicamente a isso se dava.
Tinha raiva e pressoa e a queria àquela hora, daquele jeito, em seu pecado perfeito. Então beijava lábios sem gosto e apalpava peles que não lhe acariciavam a mão. Afogou-se no perfume de cabelos sem cheiro e consumou o ato, sem carne.
E aqueles santos de rosto sintético, se fossem reais [ah, se o fossem!], já teriam se quebrado em mil partes diante do êxtase, misto de dor e gozo, daquele padre que era humano demais e agora jazia lânguido, ali nas escadarias que davam pro altar.

quarta-feira, outubro 26, 2005

Sobre Clichês, rios e falta de memória.

Eu já não me lembro muito bem - minha memória nunca foi boa - o nome daquele filósofo que, há um tempinho atrás, escreveu algo sobre nunca se poder entrar duas vezes na mesma corrente dum rio. E o rapaz era até esperto. Justificava-se dizendo que, além de as águas do rio se renovarem a cada instante, você também não continua o mesmo. Pois, veja. No instante em que sai, você já não é mais o Fulano; passa a ser Fulano-pós-entrada-no-rio.
Deu prá entender?
Então. O que quero dizer é que hoje - com o perdão da péssima metáfora - tentei entrar num Rio no qual já estive em outros tempos. Explico, pois não: Voltei pro Cursinho.
E não sei sei bem se é por ter me mantido alheia a esse tipo de ambiente por um certo tempo, ou se o ano que passou [e que tá quase acabando né? Oia bem. O que é a rapidez do tempo, não é mesmo minha gente?] é que fez de mim uma pessoa mais perceptiva. Mas, ocorre que eu tenho a impressão de que os adolescentes se encaixam com maestria e força extraordinária nos clichês humanos. Nas roupas, nos gestos, nas frases, nos papéis, no jeito de falar.
Em um dia apenas, já flagrei os hippies que devem prestar algo na área de humanas; os playboys com blusa do camarote da última festa da redondeza; os "tô nem fudendo, aê." com ar blasè o tempo todo; o apaixonado que senta do lado dela, nem tão apaixonada assim, e a assiste durante todas as aulas; as miguxas numa competição subentendida acerca de quem tem o melhor namorado, a melhor bolsa, o cabelo mais liso, e por aí vai; e mais uma penca de tipos. Flagrei até uma tímida sentada mais ali atrás, rabiscando a contracapa da apostila e dando umas olhadas esporádicas prá toda a sala, botando etiqueta em todos os tipos e tornando a abaixar a cabeça prá riscar qualquer porcaria pretensiosa no papel duro.

Sabe. Não é que eu esteja alheia a toda essa coisa. Eu sei uai, eu tô ali, naquela fase intermediária para qual os publicitários crescem os dentes. ["Ah... esses adolescentes, adoram comprar! *olhinhos de cifrão*]
Mas é que toda essa esterotipação me assusta, quando não me enjoa. Menos pelo fato de serem eles exemplares vivos do que há de mais medíocre numa faixa etária, e mais porque, até onde eu me permito dar opnião, a idade não fará tanta diferença nesses casos.
Serão adultos-classe-média estereoripados. Deixando-se divergir apenas no endereço, profissão, cor de cabelo e número de filhos.

É.
Não vou negar que já nadei nas correntes do tal Rio. Mas minha reentrada nele se faz mais difícil hoje. Sem reprimir a presunção, acho que a água é muito rasa prá mim.

sábado, outubro 22, 2005

Ausência

As folhas brancas riscadas em pontos estratégicos por cinco linhas, bem próximas umas das outras. Um caderno de música mais ou menos completo. Claves de Sol feias, feias, mais ou menos, com a ponta de cima torta e, finalmente, perfeitas.
Ele tinha ambições e ela nunca as conheceu. Agora já não mais adiantaria apertar contra o peito as folhas riscadas pela letra dele, tampouco levar o caderno a altura das narinas e cheirá-lo.
Sentia um aperto estranho no peito, como se toda ela fosse reduzir-se àquele aperto, como se aquela dor fosse torná-la pequena; minúscula ao ponto de poder passear entre as notas que ele havia desenhado nas pautas.
Desviou a visão - agora obviamente embaçada - da partitura amadora, e acalentou o quarto com os olhos. Cada objeto antes sem propósito, cada dobra nos lençóis da cama em que ele havia dormido pela última vez, cada peça de roupa que ele deixara pelo chão talhava-lhe o corpo de um jeito tão denso, que ela temeu sujar o chão com a essência que escapava de sua alma pelos buracos recém abertos.
Não era exatamente a ausência dele ali o que tanto lhe doía. Seu choro tornava-se solto e inconsolável quando ela pensava na ausência dele em todo um mundo.
Quantas tantas coisas maravilhosas aindam existiriam perfeitamente sem a presença de seu filho, e quão admirado ele poderia ficar em contemplá-las, em sentir todo um mundo.
Aqueles olhos escuros e negros que se deixavam estar atrás de óculos grossos, o sorriso que saía como se devesse se esconder, o cabelo caindo sobre a cara de menino tímido. Todo o seu filho agora se reduzia a ossos e vermes e terra e lembranças.
Chorava. E soluçava, e gritava, e esmurrava o travesseiro amassado sobre a cama, e arrancava das janelas a cortina já encardida, e se colocava de joelhos arfando e se culpando mais que qualquer outra pessoa já se culpou, por ter estado ausente quando devia estar próxima, por ter negado tanto, por ter dado tão pouca importância, e por ter saído de casa exatamente naquele dia, naquela hora, e não ter voltado a tempo de vê-lo com a arma na mão e o cano enfiado dentro da boca.


[Sem dúvida esse é um dos textos que mais me machucou prá ser escrito. Que mais demorou prá ser escrito. Se algum dia eu já tive alguma intimidade com as palavras, ao escrever esse texto ela se fez - hê hê hê ¬¬ - ausente. Inventar sentimentos e lidar com eles é uma coisa. Trabalhar com o seu e fazer dele texto, é outra.]


Ps: Não, não há nenhuma mensagem subliminar acerca do Desarmamento nesse post. Vão bater na mesma tecla em outro lugar, que isso aqui não é lugar de punheta retórica.

quarta-feira, outubro 19, 2005

[Opa. É... tá quente mesmo. Poxa vida. E ainda é primavera né? Ah, é mesmo? Então essas chuvas vão refrescar Dezembro um cadim. O referendo? Ah, eu não voto, não tenho título. Poizé. Que coisa não?
Ahhh o Mensalão. Que tristeza, que tristeza. Mas é assim mesmo. Político é tudo safado.
Mas e o Galo hein?]


Já deu prá perceber que o assunto falta, né? Vá lá então.
Comentários [inutéis e preguiçosos] sobre os dois últimos filmes vistos.


A estranha família de Igby [Igby Goes Down]
De Burr Steers



Disseram-me que Igby Goes Down foi baseado no [ótimo, por sinal] livro do J.D Salinger, O Apanhador no Campo de Centeio e que, de quebra, tinha a trilha sonora boa. Então eu vi a capa do filme com Kieran Culkin [O sobrenome te lembra alguém? Pois bem, são irmãos.] fazendo carinha de garoto problema na frente desse fundo azul e não resisti, aluguei.
Não diria que há muito da obra de Salinger no livro; diria que há muito do protagonista literário Holden Caulfield no cinematográfico Igby. Mas essa coincidência é totalmente compreensível, já que as duas obras tratam de adolescentes, esses tipos que não se diferem muito no quesito "problema". Dificuldade em aceitar que se deve crescer, que se deve tomar um rumo na vida, que não há realmente jeito de não se ser sozinho, enfim, uma série de coisas sobre a qual Travis, Dance of Days e B5 [ê-he-he] sabem falar melhor que eu.
Esse mote com o qual a identificação se faz fácil fácil pelas bandas de cá, somado às boas atuações [tem até o Ryan Philippe e a moça bocuda do Will & Grace], à trilha sonora realmente boa, à secura cortante de algumas cenas e a uma sequência chorável deveras, fazem de A estranha família de Igby um filme daqueles assim, sabe?
Simples e foda.



Maus Hábitos [Entre Tinieblas]
De Pedro Almodóvar


[faltou um poster decente, hein seu google?]

Isso é sarcasmo. [Não aquele que qualquer imbecil faz com uma apontada de dedo.]
Isso é ironia. [Não necessariamente a Machadiana.]
Isso é crítica. [Não a óbvia.]
Isso é cuspe na cara da hipocrisia. [Não aquele escarro verde e grosso, adolescente e revoltado.]
Isso é humor. [Não aquele que te faz rir sem sentir uma pontinha de ódio.]

E se o diretor de Mudança de Hábito não sugou todo o "humor de convento" que conseguiu ver nesse filme e o passou por um filtro prá tornar seu filme cabível prá Sessão da Tarde, eu já não sei de mais nada.
Assistam, pessoas. [Tá, só uma recomendação é pouco. Tem freirinha injetando heroína, tem freira tomando ácido e vendo a torta de uva toda laranja e verde, tem cantora de cabaré se apresentando com a indumentária mais brega-anos-80 impossível, tem romance de banca sendo comparado a Gabriel Garcia Marquez... Preciso falar mais?]

quinta-feira, outubro 13, 2005

Um dos Sete.
[Com pequena menção a Seu Fante - e a Leonard Cohen.]

"Camilla,

São quatro da manhã, é fim de Dezembro e a tua bolsa está ali, em cima do sofá, na mesma pose em que você a esqueceu da última vez que esteve aqui.
Quanto tempo faz? Eu já não sei. Uma semana? Nove dias? Tudo soa tão confuso prá mim agora, dias e dias deitado nessa cama, olhando pela janela esse céu grande mudar seus matizes.
Gosto quando é de manhã, e fica tudo dum azul suave, um azul que eu tenho certeza que é fresco. É nessa hora do dia em que me lembro que devia tomar um café. Mas você sabe onde é que fica a cozinha desse meu apartamento. O esforço prá levantar-me da cama, os passos que eu terei de dar, o frio que vai brincar no meu peito quando eu sair de baixo dessas cobertas... gosto não. Prefiro esticar o braço e pegar um biscoito água e sal que sei lá por que diabos anda passeando pelas proximidades do meu criado mudo.
É Camilla... não minto se digo que já houve dias melhores. E não erro se já não te chamo mais de minha. Você parece mesmo não querer mais ficar sob esse rótulo. Mulher de Arturo, o Vagabundo. Não, não fica bem. Não combina com estes cachos negros que se balançam dum jeito bonito quando você me nega algo, nem com estes olhos escuros seus cuja lembrança, poxa vida, eu dispenso porque sinto agora o calor que sentia quando era tragado prá dentro deles. [Se sinto calor tenho de escapolir das cobertas e ah não, do jeito que tá tá bom.]
Eu te perdi, eu perdi meu emprego, eu perdi peso, eu perdi o ânimo. E sinto que recuperar isso tudo está demasiado longe das minhas mãos, quase tão longe quanto o controle da tv ali no pé da cama. [Razão pela qual a Tv está ligada no AV há dias.]
Mas isso não diminui aquilo que eu sinto por você, não mesmo. Entre os meus maiores desejos dos últimos dias, ter você aqui, com a cabeça jogada nesse travesseiro vazio aqui do meu lado, só respirando aqui perto, só enchendo meu quarto com seu perfume, só passando teus olhos por mim, com certeza era o primeiro deles. O segundo era não ter mais essas vontades primitivas de ir ao banheiro e ter de me sucumbir a elas e levantar da cama. Mas isso não vem ao caso, creio eu.
Camilla, agora eu ouço buzinas vindo lá debaixo, lá da rua. Ouço umas músicas, vejo uns neons refletidos na janela do apartamento da frente. Será que você está lá embaixo? Sendo tragada pela noite? Gastando energia prá... viver? Não me parece impossível já que, no fatídico e último dia em que te vi você se ajoelhou aqui, quase onde estão as minhas pantufas, no pé da cama, e ficou com o rosto molhado a implorar que eu por favor levantasse dessa cama, que você já não conseguia mais me suportar nessa apatia, nessa preguiça - e essa palavra você disse num tom forte, contraindo os lábios com fúria e quase cuspindo em seguida a sílaba "pre", fazendo uma expressão de nojo no "gui", e cerrando os dentes prá dizer o "ça".
É. Eu penso bem agora e vejo que, do jeito que está, não havia mesmo modos de continuarmos. Já disse que eu gosto de você de um jeito que não se mede, de um tanto que não cabe. Mas é essa nossa diferença... essa sua energia... sei não querida, eu não tenho todo esse pique.
E essa carta, que tomará algumas noites minhas até que eu descubra um modo cômodo de fazer com que ela chegue até você, poderia ser resumida na linha seguinte:

Eu te amo. Venha buscar tua bolsa.

Contudo escrever sempre foi algo prazeroso prá mim, e eu já estava um bocadinho entediado por aqui.

Com carinho,

Arturo."

terça-feira, outubro 11, 2005

Caderno.

Cadernos de escola/faculdade/cursinho ou o que quer que seja costumam guardar uns escritos no mínimo curiosos.
As folhas do meu abrigam umas coisas que, hora eu penso não ter sido eu que escrevi, hora eu tenho vergonha de ter escrito. É uma confusão de sentimentos e idéias que depois de um certo tempo [uma hora, um mês, três anos] passam a já não ter mais sentido, ou confirmam seu significado - tanto faz. Divirto-me lendo essas coisas.

Oia aê:

Diretamente da aula de História Contemporânea:

"Ás vezes eu gosto de me perder no limiar de tudo. E ficar divagando, a saltar entre as extremidades tão êfemeras quanto bem marcadas das coisas.
Do último ao não suspiro - como é sentir o meio? Dói fazer a transposição?
E o instante do romper duma bexiga, a medida exata de quanto ar cabe ali dentro - eu terei algum dia?
A descarga de adrenalina que uma pele na outra causa, o durante que se faz devido a um antes e um depois, objetivamente - alguma vez na vida eu tenho de querer o certo - eu quero conhecer aquele momento.
O limite. É, o saturado. Isso é difícil de pegar nas mãos. Eu sei que há, mas tocar eu nunca irei.
É que quando eu digo que me esgoto, pode ser que eu aguentei mais que o possível, ou que ainda eu aguentaria muito [ou só um pouco] mais.
E a minha angústia é querer ver claramente até onde vou eu, até onde vai você, até onde tudo vai. Exatamente como a beira do abismo, aquela que, ainda que consciente da infinidade de todas as medidas, não permite mais nenhum movimento.
O limiar. É o desconhecido em que eu quero me perder."



E agora, Apuração e Redação Jornalística:

"Ansiedade parece um bicho te comendo pelas entranhas, o tempo todo e todo o tempo se arrasta. Como se houvesse modo de se sentir as picadas e as moridadas, e esperar como que um desespero que aquela dor não sentida pare de latejar.
É acordar e já rastrear por dentro - lá nos confins da mente - as causas prá que o tormento se dispare. Esperar pelo que vem depois quando talvez já não haja mais o que vir.
É grito preso que, se sai, já não sei, acho que se faz mais alto e forte que qualquer outra coisa que exista.
Aí o dia passa e passa a vida e ficam as horas a se arrastar, uma após a outra, e o presente não se consegue viver.
Ansiedade leva ao ócio e o ócio mata."


Tem mais, tem sim. Tem letra de música, tem cachorrinho que a gente faz emendando as letrinhas CU, tem casinha com blá blá blá saindo da chaminé, tem meu nome, tem florzinha, tem risco, tem mil besteiras.
E eu sei que não minto nem me engano se afirmar que isso não passa dum reflexo dessa cabecinha besta minha.

quinta-feira, outubro 06, 2005

[ Ele sugeriu posts com o tema "Infância". Sugeriu um parágrafo e, não falou, mas imagino que esperava alguma coisa bonita. Mas eu não sei ser tão sucinta, e a primeira lembrança que me veio à cabeça não é lá das mais infantis. Contudo não se preocupem. Fui uma criança feliz. Comia muitas balas, tinha amiguinhas prá brincar de boneca e levava uns cascudos dos meus irmãos vez ou outra - tudo muito saudável. =}]

Infância

Lembro-me de que havia buracos e de que, ao passar por eles, o carro - escolar que me trazia do colégio, outrora povoado por risos e calor de crianças - se sacudia com fúria, me jogando pro alto e recebendo meu cair em seguida.
Lembro-me de que eu praticamente não dava notícia desse ir e vir de meu corpo, imersa que estava em pensamentos desesperados, afundada que estava em rezas.
Que desse certo, que desse tudo certo. Que no bisturi dos médicos houvesse precisão como nunca houve antes no talhar de qualquer outra carne. Que soubessem que ali jogavam era com a sanidade de minha avó - Santa.
Lembro-me de que uma hora meu corpo de menina de oito anos cessou seu mover. E pelos vidros do automóvel era a frente de minha casa - com as grades verdes as paredes brancas e o jardim de mil cores que me enchia de orgulho - o que eu via. Já nas cortinas cerradas eu senti a apreensão nervosa que rondava o ambiente. A campainha não soou diferente, mas os olhos de minha mãe me percorreram dum jeito molhado e triste quando ela veio me abrir a porta, e aquilo não era usual.
Lembro-me de perceber nessa hora, que Deus parecia não gostar muito do meu jeito de rezar.

segunda-feira, outubro 03, 2005

[Relacionar-se é destruir-se
ou
O máximo que meu pessimismo consegue
ou
Getting bitter.]


Gente? De gente eu tenho é medo.
Esses seres cheios de olhos e bocas e ouvidos, e dez dedos prá meter no meio da minha cara...
... De gente. Sei se gosto não.
Eles sabem juntar sílabas e delas fazer armas, cravar espinhos na pele alheia com atos. Gente machuca, gente finge, gente mata.
O universo inteiro, com tudo o que possui de mais infindável e inefável, em poucos instantes se converge num umbigo de gente. É capacidade incompreensível de minimizar o grandioso e engrandecer o pequeno. E me diriam ainda ter razão, já que "tudo depende da ótica."
Prendem-se à lógica, ao que é palpável, ao racional. Nesse mundo de gente parece até não existir nada capaz de transcender a imaginação. Tudo cercado por grandes grades pouco espaçadas. E isso é, e isso não é.
Diz prá mim, como gostar? Eu só faço é ter medo e querer distância.
Até a hora em que me ponho frente a um espelho - essa invenção de, adivinhe quem? que prá mim só tem a serventia de massagear ou pisotear o ego de cada um - e me vejo piscar dois olhos, apontar dez dedos, abrir uma boca.
Se é gente o que eu sou, é de gente que eu preciso.
Com medo e com mágoa eu me armo, então. Se relacionar-se é preciso, finjamos logo paz, e marchemos rumo a iminente destruição.


[Rolling Stones - Wild Horses. (Músicas acompanham sempre. E o bom é que a relação é unilateral.)]

quarta-feira, setembro 28, 2005

Sobre ês outra vez.

Isso é FÓ-DÁ..

Sabe. Eu nunca fui do tipo que escuta música devido ao rótulo que é atribuído a cada banda. Nem me interesso exclusivamente por uma época e vasculho aquilo a fundo prá em seguida tomá-la como minha preferida. Meu gosto musical sempre foi uma coisa meio "lista-do-winamp-no-shuffle", sabe como? Outros chamariam de "farofa" mesmo, mas eu ando querendo me esquivar desses auto-insultos, e tudo mais.
Enfim. O fato é que entre mil bandas sem nenhuma conexão aparente entre si que compoem meu *arrem* gosto musical, o Pearl Jam se destaca como a minha preferida. E, os indecisos me entendem nessa parte, prá mim é muito difícil eleger alguma coisa como a melhor.
Eu colocar os meninos aí de cima no topo de qualquer lista minha não é causa nem da frequência com a qual eu ouço a música deles, ou do modo como todas me tocam. A questão é que foi a música do Pearl Jam que abriu em mim maior interesse por música de verdade - só o que tocava na Mtv ou no rádio ou as músicas sorteadas que eu tinha no meu computador já não eram mais suficientes depois de eu ouvir o Live On Two Legs [seleção maldita de tão boa, é o supra sumo do Pearl Jam.].
E a partir daí, eu não sei como e nem por quais meios, eu fui conhecendo outras coisas que hoje em dia eu consideraro indispensáveis.

E isso tudo é prá tentar passar a felicidade que eu senti quando soube que a banda pela qual eu tenho mais admiração viria tocar cá no Brasil. E prá fazer com que vocês percebam o meu desespero de, em seguida, descobrir que os Shows em São Paulo e Rio [as cidades mais próximas da tal Bêagá] coincidiriam com os dias do meu vestibular.
Felizmente, arrumei uma excursão maluca lá prá casa do capeta [sem querer ofender Curitiba, mas é que isso é longe demais da conta.] e já estava me dando como satisfeita. Oba, ver o Pearl Jam, oba.
Mas hoje eu vi que as coisas podem melhorar.

Dizem por aí que, é bem provável que o Show de São Paulo seja cancelado - problemas mais específicos com o local - e que, caso isso se confirme, eles tocarão numa cidade que tem uma Praça chamada Sete e ruas com os nomes dos estados brasileiros, dispostas de forma que corresponde geograficamente à posição do mapa, intercaladas com ruas de nomes de tribos indígenas.
Cidade que sempre esteve nas minhas poucas ambições e que até hoje eu me pego pensando que, peraí-eu-moro-aqui-veja-só!. Cidade que [hoje] tem um céu cinza cutucado por um monte de prediozinhos que eu não me canso de olhar.

É filho. Eu e eles aqui. Nem em sonho eu imaginaria coisa melhor.
=)

sexta-feira, setembro 23, 2005

Retrato
Cecília Meirelles

"Eu não tinha esse rosto de hoje,
Assim calmo, assim triste, assim magro,
Nem estes olhos tão vazios,
Nem o lábio amargo.

(...)

Eu não dei por esta mudança,
Tão simples, tão certa, tão fácil:
-Em que espelho ficou perdida
A minha face?"


......................................................................................... .

Posso chamar de "Retrato" também?

Hoje ela levantou-se da cama e, ao contrário do usual, o sol ainda não deixava distinguir com perfeição as fotos em cima do criado mudo. Mas a diferença nesse caso era pouca. Já sabia que num porta retrato seu filho sorria a conquista dum diploma e que, no outro, era o genro quem sorria a conquista de sua filha - esta que na foto só fazia ser bonita.
Deixou de lado as pantufas que confirmavam os alguns anos que ela já havia visto passar, e caminhou até a janela de seu quarto. Soprava uma brisa fresca, feito assopro de mãe em olho incomodado por cisco.
Parecia conveniente largar-se ali naquele frescor de dia que nasce, e então ela ficou.
As mãos pendiam do peitoril da janela e dançavam pelo vento calmo, enquanto as lembranças lambiam-nas dum jeito tão real que ela podia sentí-las saltar de dedo em dedo e conduzí-la prá um tempo em que a carne ainda era rija e não havia pintinhas no colo nem varizes nas pernas. Tempo em que podia sorrir sem que duas rugas em volta dos lábios denunciassem quantos tantos outros risos forçados ela já havia esboçado.
E essa imagem da garota de olhos brilhantes por sonhos e coração livre de amargura parecia tão diferente da pintura que os anos haviam feito dela.
Incomodava que já não mais se reconhecesse quando posta frente a frente consigo própria.
Estranhar-se a si mesma foi sentimento que a feriu por dentro. Era como se houvese uma fresta minúscula em algum lugar, pela qual sua essência escapasse sutilmente dia após dia após dia após dia.
Sacudiu a cabeça prá se desfazer de seu antigo retrato, e as mãos prá mandar embora as lembranças.
E ao sair de seus devaneios viu que o dia já se clareava, tomando cor e levando a brisa embora. Logo teria seu auge prá em seugida caminhar rumo à vermelhidão de sua morte. Doze efêmeras horas de vida.
Era bonito seu nascer, mas é fato que também enchia os olhos vê-lo desvanescer e carregar consigo tudo o que pôde comportar enquanto existiu.
Então, como era inútil e demasiado amargo lamentar o irreversível, ela afastou-se da janela, foi até a penteadeira e começou a ajeitar os cabelos grisalhos.
Ora essa. Ainda havia muito dia pela frente até a hora do pôr-do-sol.

terça-feira, setembro 20, 2005

"Eu vi quando você me viu.
Seus olhos pousaram nos meus num arrepio sutil.
Eu vi. Pois é, eu reparei.
Você me tirou prá dançar sem nunca sair do lugar
Sem botar os pés no chão, sem música prá acompanhar.
Foi só por um segundo... todo o tempo do mundo.
E o mundo todo se perdeu.
Eu vi quando você me viu.
Seus olhos buscaram nos meus o mesmo pecado febril
Eu vi. Pois é, eu reparei.
Você me tirou todo o ar prá que eu pudesse respirar
Eu sei que ninguém percebeu, foi só você e eu."


E eu que nunca dei bola prá Maria Rita me perdi nessa música. Mais de dez vezes no winamp, com tudo o que ela tem de lenta, arrastada, piegas e, vá lá, até brega.

Eu que sou a inconstância em pessoa. Que posso ser de dia só sorrisos sem causa e à noite a cara da falta de vontade, do desânimo.
Da preocupação ao poucomefodismo é um passo tão curto e sutil que eu nem o vejo. E quando me dou conta já tô lá, perdendo o olhar numa parede branca com o esmalte das unhas arrancado pelos dentes outrora ansiosos.
Puro caos em um metro e setentêtres de ossos e carne e pêlos e pele. É favor ter a boa vontade de não bater com os dedos no vidro, e transportar com cuidado. Parece não, mas é frágil.

sexta-feira, setembro 16, 2005

[Vários] Da série: Bloco de notas é grande amigo em tempos de internet problemática...

Ócio
-Mas tá na cara, ela não vem.
-Eu sei. E é por isso que gosto da espera.


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Conclua prá mim, caro leitor. [Ou "opa! tá conectado! *clique no botão xis do bloco de notas."]

Ócio, vício. Me diz até onde a ausência me basta.
Ócio vi. Ciúme diz até onde a ausência me basta.
Oh, se o vício me diz até onde a ausência me basta,
(...) <- (é aqui que você entra.)


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Só prá usar uma palavra que eu gosto.

E lá se vai, lascivo.
A mexer os quadris com ginga que é só dele, e de mais ninguém.
Não peca pelo exagero da vestimenta, nem pela caricatura dos gestos. Só peca por se ir.
Assim, lascivo.


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Perca o Fôlego.

Um "ai" prá mim é um "ai" ou um resto de palavra que não se sustenta sozinha.[E cai]
Mas se dói em você [ai é dor e aí] eu sentia arder do mesmo jeito que arde em ti e como é que pode, ser tão igual assim?
Um ponto pode ser só terminação duma frase. Ou pode ser o dedo na boca prá não deixar saltar mais palavra.
Mas com um ponto meu eu te atinjo n´outros mil pontos teus que, juro eu, nunca soube ou imaginei que sequer existiriam.
Então não venhas tu ler poesia ou prosa ou frase ou rabisco meu e dizer que sabe o que é que eu queria dizer.
O que eu quero dizer eu já sei, vê bem filho, eu já até eternizei.
Leia-me e pense em você e deixe que as palavras te batam e te partam e te repartam e só então se depare com o que há de mim por aí.
[E à merda com isso aqui.]


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E uma última coisa boa, prá que vocês não pensem que a vieram até aqui em vão.

"Quando acordou, o dinossauro ainda estava lá."
Microconto de Augusto Monterroso, quase que discutido numa aula hoje. Tá que meu professor fez uma análise bacana e tudo mais, mas a melhor interpretação, sem dúvida, veio dum rapaz lá do fundo da sala: "Bem, pode ter sido que o cara foi dormir bêbado com uma mulher bem feia e quando acordou..."
[Ah, tenha bom humor, vai. Foi engraçado. :B]

terça-feira, setembro 13, 2005

Acontece que eu tenho andado realmente sem o que dizer. Andei escrevendo algumas besteiras numas de minhas idas à biblioteca, [poizé, agora eu vou prá lá depois da faculdade fingir que estudo pro vestibular. Fingir com todo o significado da coisa, porque se já tem me faltado concentração prá aulas como "história contemporânea", o que dizer de estudar Física Elétrica.] mas é tudo muito coisa de momento, de fluxo de consciência, talvez, de descrever o que eu vejo a minha volta.
Mas, me incomoda deixar isso aqui às moscas. Então vá aí, um texto de algum tempo atrás.
Bobo. Poderia ser assinado por uma garotinha de 12 anos apaixonada pelo cara bonitinho da escola. O sentimento é o mesmo, eu sei que é. Mas é que, prá algumas coisas eu ainda não cresci não. [Prá muitas outras também não.]
E, admito. Toda essa introdução é prá me livrar um pouquinho do constrangimento de ter escrito coisa tão infantil e platônica.


Para o meu [quase] amor platônico.

Não sei direito, ô menino.
Eu acho que é esse teu jeito de olhar pros teus pés por pura vergonha de encarar aquela gente toda na tua frente. Meio tímido assim, como se se expor daquele jeito fosse coisa que doía.
Mas pode ser também a rapidez esperta de quem tem medo de se deixar errar, essa que você me deixa ver quando, entre um acorde certo e outro triste, tira uma mão da guitarra e a leva até o rosto prá ajustar os óculos que quase caem do nariz.
Penso até que talvez seja a tua voz, essa tua voz que canta o que às vezes eu sinto, o que eu sei entender até quando se faz grito, de dor ou de raiva ou de alívio - eu não sei.
Mas é que nessa sua indiferença imperfeita, você me ganha dum jeito que me confude e só deixa restar a certeza de que, ah garoto. Basta um "oi" seu prá eu me perder de vez.



[Em tempo: É tão infantil o sentimento, que já passou. Dele ficaram só as letras e umas lembranças bonitinhas.]

Ouvindo - Smashing Pumpkins, 1979 (falar neles, não fosse a minha pobreza gigantesca, quase teria comprado aquele cd cuja capa tem porquinhos, deles, hoje. 19 reais. Mas eu só tinha 20, e era pro presente da minha mãe.)

segunda-feira, setembro 12, 2005

Alô.


Lara não está, quem deseja? Sim. Sim, sim. Pode deixar. Qual seu número? Hum. Vinte e dois? Certo. Certo. Então, até... Vem cá. Ela não está, mas... Quer falar comigo?

Meu nome é Rafael, não que isso mude muita coisa. Não muda nada. Sabe, nunca gostei do meu nome. Torcia pra ser algum autor famoso (ou famoso autor) e ter um nome artístico, um que eu mesmo escolhesse. Mas sabe como são as coisas. Vou acabar como médico fazendo plantão em algum hospital por aí. Quem sabe ainda não corto da tua carne. Não, não desligue. Sou normal no sentido mais mediano da normaleza, mais frígido da sutileza.

E, sim, a Lara não tarda. Escritor tem um pouco de masoquista. Todas dores caem para o lado mais chato, o do escritor. Às vezes, já diria Fernando Pessoa, é bom não cumprir um dever, não ler um livro. Lara está dormindo e não quer ser acordada. Quando despertar vai dar a cara, ainda amassada, ao tapa, só para conseguir algumas linhas pra prender tua atenção, leitor sanguinário. Deixo um parágrafo sobre o assunto e um beijo no meio da testa para quem ouviu minha história.

Sentado. Pernas cruzadas hora para a direita, hora para a esquerda. Corpo curvado. Pelas mãos, derretidas, escorria tudo do que era de fraco nesse mundo. Os olhos, secos e turvos, buscavam no vazio algo para se acomodar e disfarçar o silêncio. Nada. Folheou o livro com medo de cruzar um olhar. Drummond não tinha nada para dizer. Nem Veríssimo, nem Rosa, nem ninguém, nem mesmo a senhora descalça que andava a passear pela calçada. Pensou em criar um verso. Pensou. Cinco minutos se enterraram com dois sonetos alexandrinos, versos todos heptossilábicos. Era todo poeta e nada homem. Arquitetara doze romances até a data em questão, e não tinha ao menos verve para encetar o seu. Naquele instante, era o mais pobre dos desafortunados, um escritor sem palavras e com uma puta de uma mancha de suor nas axilas. O nervosismo cerrara a boca, que, seca e estilhaçada, mal esperava pelo beijo que, de fato, não ocorreu. Foi-se a tarde. Beijo no rosto, mão no ombro, o adeus. Na rua fria e solitária, respirava aliviado a anotar os sentimentos.

terça-feira, setembro 06, 2005

[Retrato] (não necessariamente pra Iaiá.)

Que a perna dele, suja e peluda, entrelaçava as coxas dela, não menos sujas, contudo menos peludas, isso eu via. Mas o cheiro de mijo e marginalidade que aquele enlace exalava, isso aí era coisa de se sentir.
Os ossos das costas pareciam querer furar a camisa amarela da mulher e fugir prá outro lugar - eram alvos demais prá suportar tanta imundície - mas uma mão de nós calejados e textura áspera os acariciava, como se dissesse que ficassem por ali mesmo, que era lugar conhecido há tempos, que era onde eles cabiam direito.
Havia olhos - se há contato eles sempre estão lá - e eles se encontravam. Dum brilho meio fosco, não admira que fossem cinza, dum reflexo de insanidade abandonada tempos atrás [ou horas, ou anos.]. E se as pupilas perdidas umas nas outras diziam algo, a cortina de sujeira que os separavam do resto do mundo não permitia distinguir o que era.
Se demoravam e se namoravam ali, em quarto se mquatro paredes, em cama de cobertor roto - e só o cobertor. E era como se calados e perdidos na desgraça um do outro se encontrassem, prá tornar a se perder do mundo que os cospe os rejeita porque eles não são limpos e decentes como convém.

Da sujeira que se encaixava como vingança e contestação involuntária. Do amor ou da conveniência - isso aí não me deixaram perceber. Dum casal abraçado no chão da praça. Disso tudo eu fiz um retrato.

domingo, setembro 04, 2005

Mais com ele, em mais ócio no msn.
Dessa vez a gente se resolveu pelos microcontos, e, manteve o limite de cinquenta caracteres por cada.
[É bem verdade que acho que ultrapassei algumas letrinhas em algum destes. Mas, ninguém morre por isso, né mesmo?]


Na espera
Cheiro bom fugia da cozinha
Fome escorre pelos olhos do tio

Bobalegre
Suor dor fome e... sorriso.
É que eu ando com felicite aguda.

Pedra no espelho
Pedante que é pedante
Disfarça o gosto por isso

Suicida
Corpo no chão e veneno do lado.
Será que não sabia que era pra rato?

Roedor
Vão se as unhas
Ficam os dedos

Fábula de quem não teve infância
U cuelu filiz tlavessava a lua
Veiu calu e fez plófff!
(...)

Some Viagra, Please (ou "Aquele do coelinho")
Vai ser bom, não foi, querida?

Fantasista
Viu o mar pela janela
Mergulhou...
Esqueceu da avenida

O vaso quebrou
É fato
Parnasianos
nunca comeram ninguém

Ah, a maternidade!
Acordou de madrugada com o choro do bebê.
(...)
- Maldita pílula de farinha.

Shit happens
- Enfim o porquê da exist...
Pá!
- Lugar de doutô num é no Rio

Verdade
Pior que explicar piada
É explicar micro-conto

Casas Pernambucanas
- Quem bate?
- É o frio...
E caiu de susto com a voz.

Saudosismo nerd
/compuserv set icq sound mode "on"

Infância anos 90
/msdos
/c:
/jogos
/supermario
/exe

Loser
De pequeno,
nunca peguei a Carmen Sandiego

Zóio prêto
Sangue do naíz
Láguima no zói
- Quem quié cupado?
- O zoto, mãe!

Perú no bum-bum (ou "Palhaço pedófilo")
Tudo começou com a bitoca no nariz.

E saiu pela porta a cantar
I know, it's only tchu-tchu-tchu
But I like it!



[E se eu disser que é a terceira vez que Don´t lie, do Black Eyed Peas roda por aqui, eu mereço uma pedra no meio da testa? Ainda acho que vale especificar que não, eu não me rebaixei ao ponto de baixar a mp3 dessa música. Na questão de manter um pouquinho de minha compostura, a rádio Terra tem me ajudado.]

quinta-feira, setembro 01, 2005

Clarice. Aurélio.



- Prá mim? Pouco me importa. É que nem aquele poema do Pessoa, sabe qual?
- Tá vendo? É isso que me irrita em você! Essa mania de não levar um assunto adiante, esse seu jeito de sempre sair pelas beradas! "Diálogo de referência" e eu aqui, de mala na mão te dizendo que vou embora. Hunf.

(Ele desvia os olhos do livro que estava em suas mãos e leva-os até a mala postada no chão ao lado de um par de pés. Sobe o olhar calmamente até fixá-lo nos outros dois olhos que estavam na sala.)

- Tô saindo pelas beiradas não. É que realmente não me importa. É sua a vontade de ir? Porta e rua, tchau e bença. Coisa chata é estar-se preso por falta de vontade. Porque, se for daquele jeito que o Camões coloca, a história é outra, cê num acha?

(Ela bufa e faz levantar uma mecha de seu cabelo, que sobe até a altura dos olhos prá, em seguida, voltar rapidinho a seu lugar.)

- Sempre bancando o forte, né? Vai dizer que não te dói aí dentro saber que eu vou e não volto, que lá fora eu me arranjo com outro, que aí eu não vou ser mais só sua.

(Ele pensa por um breve segundo e segue com os olhos ainda no livro.)

- Hum... Só me incomodo de ter de dormir sozinho. Tem feito frio por aqui, sabe. Mas, quanto ao que você fará, é teu o corpo, não meu. Além do que, em relação a ciúme você sabe que eu nunca fui nenhum Bentinho, né?

- Ah não, não. Pára Aurélio. Pára logo, antes que você comece a tagarelar sobre esse tal Dom Masmurro outra vez.

- Masmurro não, Clarice; É Casmurro, com cê.

- Bah! Que seja! Isso só faz diferença prá você, que vive esses livros, que vive dentro deles e esquece daquilo que conquistou aqui, fora das páginas. Você não percebe a gravidade das coisas? Eu sou a sua menina, poxa. Eu te amo, você tem um compromisso a zelar comigo! Não é possível que você seja tão frio!

- Ííí... Lá vem você com esse papo de "Pequeno Príncipe" outra vez. "Tu te tornas responsável por aquilo que cativas e blá blá blá..." Já te falei, Clarice. Isso é livro de Miss, isso é sub-literatura. Cê não pode levar essas coisas tão a sério...

(Clarice olha no fundo dos olhos de Aurélio e sente a raiva tornar rubras as suas bochechas. Um fio gelado se escorre por uma linha que vai da nuca às suas costas, e as pernas deixam de se firmar com precisão. Ela Salta no sofá e, depois de puxar os cabelos, socar o estômago, arranhar o rosto e estapear Aurélio - não sem soltar gritos e urros e uivos - , toma o livro que ele tinha em mãos e começa a rasgar as páginas e jogá-las pro alto, pros lados, pro chão, pra si. Ao se cansar, sem dizer mais palavra, apanha a mala do chão, passa da porta e ganha a rua.)

(Aurélio permanece sentado no sofá, contemplando pelo chão da sala os destroços a que se reduziu seu livrinho de bolso. Suspira pesadamente, e apoia a cabeça na mão direita.)


- É, até que eu gostava dela. Tinha alguma coisa, que eu nunca soube bem o que, mas que me lembrava insistentemente a Lispector...

segunda-feira, agosto 29, 2005

Catártico

Parco porco presto e morto
Posto fosco
Escravo fraco
Frágil a voar por entre correntes duplas e compotas de putas frescas e macias e tenras

Por noites escuras a achar que é gente
Por ruas frias a pensar que é potro
A correr a galopar e tropeçar e tropeçar
Sangue misturado ao vômito e suor e ranho e porra e escória escorre pelas pernas
E a sanidade vai como mijo pela cueca

E se é e se não é
E se pode não balança com as patas na'lgibeira
Embriagado de luar a imaginar o mar que nunca viu nem nunca virá enquanto passagem for coisa de burguês

Mergulha
Em feiúra quando diz que é
Duplo
(e)
Mergulha
Em dobro
Mergulha
Mais de uma vez
Mergulha
(aos montes)

Mas volta seco de pó
Secado em feiúra
Pecado
De impuro de incasto de inútil
Flagelo
Na pele tem talho de ato
Falho sempre ao tentar ser errôneo
Um lado de culpa e outro de dedo que aponta
Busca solução e torna a mergulhar na feiúra de

Achar que estava em Drummond em Bandeira em Rodrigues em Lispector e se viu no espelho
Nu como o mais nu dos nus
Cheio de pêlos que pelos peitos escorriam como se quisessem fugir pelos ombros
(que não suportam um mundo, nem ao menos uma farpa de mundo)

E se fosse homem se fosse forte se fosse alguém
(alguém de algum país de alguma cidade de alguma rua de alguma casa)
Se fosse alguém teria dado cabo ao cabo
Enrolado no pescoço e jogado pela janela

Mas não é ninguém é dos fracos não é macho
(e nem sabe onde é que fica e quem paga e quem habita a casa em que dorme todo dia)
Não há cacife para acabar com coisa nenhuma
Quem dirá com esse martírio que chamam de vida e que empurram como se dele fosse

Infecundo feto de um mundo que gira noite e dia
E as horas passam como o trem que passa todo dia às oito horas a acordar os pobres que foderam a noite inteira
E como tratores esmagam qualquer pio de diferença e brilho
E todo moralismo recai sobre o chapéu do sertanejo deslocado no êxodo de sessenta e seis

E não é apatia falta de propósito ou de tentativa
É que o que é se escancara demais e persegue até no canto mais teu em que se busca esconder
O cotidiano não se solta dos olhos, só salta até eles
Do menino que acata às ordens de se segurar dentro do ônibus, do sopapo que a puta levou no pé do ouvido, das mãos sujas e da mente leve do despudorado
Da vida não se escapa

E pelo tempo a escoar as rugas a nascer e esfarelar ossos e prédios
Por esgotos a cair e levar pura merda com pedaços de milho amarelo-ouro
Comendo banana-maçã e laranja-pêra a imaginar quão doce era a p a m o n h a f r e s q u i n h a p a m o n h a da infância no norte
Com o eterno fardo da vida
Deu o tiro e não morreu

Lara Spagnol e Rafael Romero



[Conversas de Msn no domingo à noite às vezes dão frutos.]

sexta-feira, agosto 26, 2005

Ês vem mãe! Ês vem sim!


"Tá bom, tá bom. A gente toca no Brasil, já que vocês insistem."

Eu já não acreditava que fosse ser possível não. Pra mim, Garota de Ipanema no site oficial era obra do acaso, e boatos eram só boatos mesmo.
Mas ontem o Seu Lulu confirmou. O negócio é verdade.
O Pearl Jam vem ao Brasil em Dezembro, e toca em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Curitiba.
Vocês não tão vendo a minha cara não, né?
Então eu descrevo. Meio que um sorriso de orelha a orelha, de quem não sabe como vai ou como volta, com o que paga o ingresso e nem com que forças vai aguentar a ansiedade, mas que vai ver A banda, e pronto acabou.

quarta-feira, agosto 24, 2005

A abertura do Indie [Mostra de Cinema Mundial que acontece aqui em Bh e exibe gratuitamente trocentos filmes de vários países ] foi hoje, e eu, pobre e interessada por cinema que sou, fui lá na Praça da Liberdade pra ver do que se tratava.
Esperava ver algo bom, mas não tão bom quanto Casa Vazia, que foi o filme exibido hoje.


[:~]

Não sei bem se todo o diferencial que me prendeu tanto a atenção vem do fato de o diretor [Kim Ki-duk] e o filme serem Coreanos, mas afirmo que, pelo menos entre tudo o que eu assisti esse ano, Casa Vazia se destaca como uma das melhores e mais bonitas coisas.
Trilha sonora, fotografia, roteiro, as atuações... tudo consegue se distanciar do óbvio sem deixar de ser simples, encantador.
Não vou entrar em detalhes aqui, como o riso bobo que brotou na minha cara durante certas partes da exibição, ou o fato de que eu segurei pra não me deixar chorar no meio de uma praça pública.
O fato é que, se o nível do Indie é todo esse, eu não quero perder nem meia sessão.

segunda-feira, agosto 22, 2005

Dia 36

Esquece não, pensa mais.
Olha prá tua sombra que te segue no chão - e nunca te deixará - assim como teus erros sutis, tua culpa que faz esses olhos mirarem... a tua sombra que te segue no chão.
Um ladrilho colorido e todo aquele cinza. Flap-flap-flap dos chinelinhos amarelos que, malditos, parecem cantar aquilo que você não devia ter feito mas fez - A vergonha estampada na falta de coragem pra erguer o rosto que clama por soco tapa cuspe.
É, um tapa na cara não seria de todo mal, e por hora soa desejável. Por hora soa desejável. Não eu, não eu, tsc tsc, eu não. Merece um cuspe no meio da testa aquele que me disse vulgaridades impensadas, grunhidas, dispensáveis.
Não fosse toda essa fraqueza. Toda essa necessidade de que me tirem antes o copo da mão, de que me empurrem pra fora do alvo.
Amanhã não é dia 26 mas, quem sabe vive outra vez, e tira de mim um pouco de toda essa vida que embaça meu olhar.
As lembranças, eu prefiro existir sem, e deixar na minha mente só o brilho eterno.
Mas aí o caminho já era de volta e eu sem soco tapa cuspe resposta. Só as lembranças que eu não queria ter.
Mas, não é mais dia 23, e tudo começa outra vez.
Esquece, não pensa mais.



[Escancarado assim cês ainda não viram, né? Entam ouçam Dia 36 d´Os Mutantes. Ou num ouçam.]

sexta-feira, agosto 19, 2005

Sobre estudantes de jornalismo indecisos

Então.
Depois de fazer drama, rolar na cama à noite, fazer de "eu não sei" uma das expressões mais recorrentes no meu discurso, imaginar um milhão de possibilidades e desfechos, desentender-me comigo mesma e me embaralhar nas minhas próprias pernas [entre outras muitas coisas que caracterizam uma pessoa indecisa], eu acabei optando por isso aí, ó. [Não o fotolog, seu besta. E sim o que está postado lá.]
Não estou segura de nada, mas eu gostaria que tudo desse certo e eu me visse satisfeita no final das contas.
Sorte? Eu gostaria que vocês desejassem, apesar do ceticismo habitual. =}

___________________________________________


Sobre Publicitários imbecis

Não que eu odeie toda a corja daqueles que estudam as filhadaputices do mundo da propaganda, não é isso. E também não vem ao caso a insistência destes em chamar de arte aquilo que intenciona vender a [falsa] materialização de seu desejo.
O comentário hoje é sobre aqueles que se destinam a área de cosméticos, especificamente de produtos pra cabelos.
Pois bem. É fato que o meu cabelo não é daqueles que basta enfiar embaixo do chuveiro, passar sabão de coco, pentear com pente fino e pronto acabou. Muito, muito, muuuuuuito pelo contrário, até. Mas não é por isso que eu preciso ir ao supermercado e dar de cara com um Condicionador com Efeito Anti-Palha na minha frente. Poxa vida. O "Para cabelos secos, danificados e quebradiços" [leia-se, para aqueles que possuem espigas de milho secas ao invés de fios de cabelo na cabeça] eu posso aguentar, eu levo numa boa. Mas Efeito Anti-Palha? É demais pra mim.
Fico a pensar se o tal publicitário dessa marca nunca estudou nada sobre auto estima alheia, ou simplesmente quais termos se deve e quais não se deve usar no rótulo de um produto.
Apesar de ferida no orgulho e tudo mais, eu ia levando o tal condicionador. [É dos bons, apesar de ter a embalagem feita por um publicitário-asno.] Então, eis que chego na prateleira da frente, a dos cremes pra pentear - tô falando que o cabelo é dos danados - e me deparo com coisa pior.
*Arram* "Você adoraria prolongar aquele momento mágico do seu cabelo, quando ele está entre úmido e seco, e parece estar mais longo, os cachos definidos e o volume controlado? Nós descobrimos o segredo desse momento mágico e blá blá blá..."
¬¬
Tô dizendo, os tais publicitários dessa área são tipos acéfalos. Quando não pensam que as pessoas não tem amor próprio, já vão achando que são todos tão retardados quanto eles.
"Momento mágico"? E eu que nem sabia que isso existia.
Mas, então.
Após o momento papo de cabeleireiro, vou ali fazer a unha.
Espero que tenha Caras pra ler e não deixar escapar essa catarse de futilidade.

terça-feira, agosto 16, 2005

"Help me if you can, I'm feeling down
And I do appreciate you being round.
Help me, get my feet back on the ground,
Won't you please, please help me.
And now my life has changed in oh so many ways,
My independence seems to vanish in the haze.
But every now and then I feel so insecure..."


O cruel dessa música é que, por trás de guitarrinhas animadas e cantoria feliz, quase que o que a sua letra expressa passa desapercebido.
Se bem que, talvez realmente passe, e só quem ouviu de vozes amigas há pouco tempo coisas tipo "Você tá totalmente perdida, eu nunca te vi assim.", se dê ao trabalho de descortinar a melodia feliz e se apegar ao que essa música traz de desespero.

Poizé. Até que, por hora, as coisas que eu [acho que] queria não são muitas.
Se definem basicamente num gatinho de estimação prá chamar de Arturo, num outro lugar pra morar, e na resposta praquela questão que começa com o-quê-cô-faço e termina com da-minha-vida-interrogação.

Won´t you please, please help me?

domingo, agosto 14, 2005

Há dias em que você acorda e a janela, o painel de fotos e as paredes dançam na frente dos seus olhos. Daí você resolve passar os olhos pelo quarto pra tentar tomar um pouco de consciência [na falta desta, água também ajuda] e vê suas roupas jogadas pelo chão, o que te faz pensar que, "Hey, foi com isso que eu saí ontem a noite.". Em seguida, por coincidência ou não, você percebe que seu hálito é um dos piores que você já sentiu, e sente a cabeça se juntar com o estômago na tentativa de te incomodar.
Nessas horas, mais que nunca, você compreende por inteiro o significado da célebre expressão Vontade de ter outra vida.


E nem todo o Jesus & Maria Correntes [Argh, Lara!] são o suficiente prá tirar a dor e a vergonha sua cabeça, nesses dias.
Eita.

terça-feira, agosto 09, 2005

[Espelho]

Ia eu lá, subindo aquele tão odioso quanto íngreme morro de todos os dias, quase que perdida entre devaneios, hipóteses, raiva e sono, quando eis que, feito a pedra no caminho de Drummond, uma van se estacionou atravessada na subida. Fosse eu poetisa, faria do desconforto de ter de dar a volta pelo automóvel um poema. Contudo, eu sei lá que diabos sou, e era cedo demais pra pensar em versos.
Continuei então arfando meu sedentarismo e rumando morro acima, até que senti uns olhos passeando por mim. Mas passeando de um jeito diferente, não como se desejassem ou repudiassem a pele, não era isso. Pareciam perfurar a casca prá observar e tentar entender o que havia do lado de dentro.
Eu não podia ignorar aquela invasão e simplesmente continuar marchando pro ponto de ônbius. Virei-me e, como se fôssemos nós dois os únicos seres viventes do mundo, meus olhos se fixaram diretamente naqueles que me observavam, presentes [erroneamente, creio eu] no rosto de um garotinho. Pele clara, cabelos pretos e lisos, a cara virada pra fora da janela do carro e um jeito calmo de ignorar todas as outras crianças que se encontravam a seu lado.
Pouco mais de oito anos de vida e o meu jeito ladrão de olhar para os outros, prestes a roubar o pouco de essência que os gestos descuidados alheios deixam escapar.
Nem metade de minha idade e a audácia de me invadir assim, sutilmente, como é hábito meu fazer.
Mantive o contato visual, e ele parecia não ceder. Parada feito tola no meio da ladeira, o fôlego tomado pelo cansaço e pela surpresa, eu sentia esse garoto perceber o que eu era, e não alterar nem um músculo da face a cada momento de sua descoberta.
Muito tempo me pareceu passar nesses meus segundos de derrota, até que me senti descarnada e exposta o bastante prá me dar por vencida.
Tomei novamente o que seria meu caminho há instantes atrás [porque agora eu já não sentia mais ter um rumo], e terminei a subida, não sem praguejar o tal garotinho.
"Maldito. Aposto que vai chegar em casa e me usar num de seus escritos bestas. Hunf."



[É que a aula de fotografia tava meio chatinha, sabe. Câmara obscura, papel sensível a luz, num sei que lá de prata, blá blá blá. *bocejo.]

domingo, agosto 07, 2005

O texto aí embaixo, basicamente, sou eu me excedendo num comentário em um dos post´s [exatamente no do dia 30/07] desse menino aqui ó.
Porque, pelo menos a mim, parece muito sincero o jeito fácil dele de se apaixonar pelas pessoas.


[Lara said]

Seria muita besteira sentir inveja de tua paixão? Sentir inveja desse teu gostar, que aperta o peito e faz surgirem lágrimas nos olhos quando o momento [qualquer momento] traz um pouquinho de sentimentalidade? Eu sou boba demais se quero fazer com que as músicas antes sem sentido comecem a tomar forma lógica em meus ouvidos, e façam surgir de meus lábios um sorriso pateta, talvez até mesmo feiinho?
Não sei se tenho tua aprovação, mas te invejo. Invejo o sentimento que faz os passos dela ecoarem atrás de você pela calçada. Invejo a lembrança doce que a pulseirinha dela em teu braço te traz. Invejo até o jeito como tuas pernas não se firmam direito quando ela se aproxima.
Ah, menino. Eu queria mais que muitas coisas que eu quero - e você não sabe como são vastas as coisas que quero - sentir meu coração ficar vivo por alguém, cantar "clareia a minha vida amor, no olhar" quando o "amor" serve de vocativo pra alguém. Você não imagina como eu queria me sentir gente de novo, como eu queria sofrer de novo e praguejar contra todos os homens existentes, dizer que nunca mais vou gostar de ninguém, chorar de raiva e me olhar no espelho em seguida, a me sentir a pessoa mais ridícula e "inamável" do mundo.
Tu não sabes como eu queria fazer neologismos apaixonados... como eu queria sentir meu peito subindo e descendo vagarosamente, a deixar um frio estranho no meu estômago denunciando que, se prepare menininha, vem coisa por aí.
Eu quero esse teu jeito de se apaixonar por todos, simultaneamente. Eu quero chegar em casa e ter em quem pensar, sentir o coração bater forte quando sei que, lá onde eu vou, ele vai também.
Menino, garoto, rapaz. Eu te invejo com a melhor inveja do mundo. Eu invejo o teu gostar, eu invejo o que há mais de humano e irracional em você.
Porque, ás vezes eu acho que me perdi no meio de palavras e pensamentos e medo. E paixão - quem dera.
É coisa que eu temo não nascer mais por esses cantos de cá.

quinta-feira, agosto 04, 2005


[Essa capa é muito "arte" pra mim.]


Então, num surto de consumismo misturado com a confusa [e falsa] idéia de que eu possuía algum dinheiro, eu desembolsei 30 contos no 4 do Los Hermanos.
Poderia até dizer que é pra fazer valer a investida monetária que eu não tenho escutado outra coisa desde Terça Feira. Mas é verdade é que esses meninos continuam sabendo fazer música.
De fato ainda é cedo pra que eu expresse alguma opinião definitiva sobre o disco porque, por incrível que pareça, acho que Los Hermanos exige um pouquinho de paciência pra com certas músicas.
Mas, por hora, achei o cd bastante bom. As músicas estão bem diversificadas, algumas bastante tristes como "Os pássaros", "Sapato novo" [essa lembra bastante aquelas músicas fossa do Chico Buarque], e "Pois É" [minha preferida], outras dançantes, a exemplo de "Morena", "Condicional" e "Paquetá" [Essa tem os dois pés na salsa e, acredite, é muito boa], e aquelas que lembram samba, ainda que na letra, como "Fez-se Mar" ["Clareia no tempo / Cadeia das horas / Eu meço no tempo / O passo das horas"].
O single "O Vento" à primeira vista não tem nada de radiofônico além da guitarra completamente "Strokiniana" [U-au lara.]. Mas após algumas escutadas, o último trecho gruda de forma insistente na cabeça, e é aí que você percebe onde estava o lado chiclete da música. É também a que mais se aproxima do "róque" em todo o disco, e talvez seja por isso que tenha sido escolhida como música de trabalho.
Apenas uma música ainda não me desceu: Horizonte Distante. Soa toda fora de lugar, mas daquele jeito desproposital, sabe como? A distorção da guitarra utilizada lá pelo meio e os saxofones/trompetes [não sei ao certo o que é] que crescem de um jeito meio "musical da Disney" não me agradaram mesmo. CQuanto a letra, porém, nada contra.
E por falar nas letras, estas andam um pouco tristinhas em sua maioria. Até aí nada novo, já que os Los Hermanos não são nenhum tipo de Poliana no que diz respeito às suas composições. O que me intrigou mesmo foi a insistência do Camelo com a tal "Morena". Se ele não se apaixonou por uma, ele descobriu essa palavra anteontem. Porque, além da música que leva esse título, em outras duas ele chama por essa tal Morena. Eu hein.

Mas, enfim. Descrever música é coisa complicada pra mim. Bom mesmo é pegar e ouvir. Mas já adianto: Por hora, meu cd não tá em situação de empréstimo.
Daqui alguns meses, quem sabe.

terça-feira, agosto 02, 2005

Assinando o atestado de alienada.
[Não com orgulho, vale dizer.]

É fato que a mídia e as pessoas ultimamente parecem não ter outro assunto senão esse tal mensalão e as malas cheias de dinheiros sendo levadas de não sei onde para não sei onde, as denúncias do Roberto Jefferson e qualquer outra coisa que envolva a lama na qual o atual governo tem chafurdado.
Acontece que esse assunto simplesmente não me interessa. Não sinto a menor atração pelo português errado dos senadores, pela falta de caráter de não sei quem, pelo desenrolar, enfim, de toda essa coisa.
E ligar a televisão ou passar o olho pelas revistas da banca é dar de cara com isso, sem erro. Até no ponto de ônibus, compenetrada em complexas questões, ["Chegá leim casa eu como pão com manteiga esquentado ou não?"] eu não deixo de escutar as famigeradas palavrinhas saindo da boca de alguém para formar frases que, pra mim, nem tem muito sentido. E não, não acho graça dos senadores e deputados e secretárias se estapeando verbalmente usando vocativos rebuscados.
Eu não sei, deve ser questão de gosto. Outras coisas, provavelmente bestas e desinteressantes como um graveto pra maioria das pessoas, prendem tão mais a minha atenção. Comigo também não vai servir o argumento de que então eu não sei o que se passa em meu país. Não serve mesmo, porque, pra maioria das pessoas que acompanha tão assiduamente esse circo já montado, o que interessa é o mesmo que o Programa do Ratinho oferece: O que há de pior no ser humano a ser exposto para quem quiser ver. Ver a podridão alheia e saber quem será o alvo das frustrações e raivas da vez.

Eu? Dispenso. Podridão eu prefiro ver em personagens. Deve ser por isso que filmes e livros e qualquer coisa inventada me cativem mais e façam de mim uma moça tranquila e conscientemente alienada.

segunda-feira, agosto 01, 2005

"(...)Saio em segredo
Você nem vai notar
E assim sem despedida
Saio de sua vida
Tão espetacular

E ao chegar lá fora
Direi que fui embora
E que o mundo já pode se acabar
Pois tudo mais que existe
Só faz lembrar que o triste
Está em todo lugar

E quando acordo cedo
De uma noite sem sal
Sinto o gosto azedo
De uma vida doce
E amarga no final

Saio sem alarde
Sei que já vou tarde
Não tenho pressa
Nada a me esperar
Nenhuma novidade
As ruas da cidade
O mesmo velho mar..."


Pato Fu - Agridoce


Música linda. E Belo Horizonte hoje.
Férias boas, bastante boas. Espero que o próximo semestre esteja a altura, e não deixe em mim um saudosismo vazio.
Vai ser bom, vai sim.

Boa noite pra vocês, e boa viagem pra mim.

sábado, julho 30, 2005



Apesar de o cinema em Ipatinga só ter disponibilizado versões dubladas do filme, eu vi hoje, e achei fantástico. [Não conseguiria achar trocadilho mais infame.].
Eu costumo gostar bastante do Johnny Depp, mas nessa nova versão de A Fantástica Fábrica de Chocolates ele tá um absurdo. Consegue ser peculiar e expressivo sem ficar caricato, ou ridículo. E até os atores mirins, que costumam causar vergonha alheia, cumprem seu papel direitinho. Alguns chegam até a serem simpáticos, acredita? Juro.
É fato que a versão dublada do filme prejudica sem medida, mas as caras do[s] Oompa Loompa, as dancinhas, os cenários, a cena na qual é feita uma [grande] menção ao 2001 - Uma Odisséia no Espaço e toda a ironia que faz refletir se aquilo ali é realmente um filme pra crianças, fazem valer a pena o esforço de escutar aquelas vozes já conhecidas do Sessão da Tarde.
E, quanto às comparações com a versão original, é óbvio que a tendência de quem cresceu assistindo às infinitas reprises desse filme no Sbt, seja preferir o antigo, por uma questão até mesmo sentimental e tudo. Mas eu não diria que a versão atual deixa a desejar. Não mesmo, de forma alguma.
Se ter conseguido me empolgar é uma carcterística boa num filme, eu diria que recomendo este sem dúvidas.

[Ouvindo Pois é / Dois Barcos, do cd novo do Los Hermanos. Por enquanto esse tal Quatro tá muito bom.]

quarta-feira, julho 27, 2005

"Envolvia-a com os meus braços, beijei-a e chorei pelo meu pai e por todos os pais e todos os filhos também, por estarem vivos em tempos como aqueles, por mim, (...) não havia escolha, eu tinha que conseguir."


[Pose de fotologger, ok.]

Eu acho que simples e intenso do jeito que tá aí, eu não preciso dizer que é John Fante. O personagem não se chama Arturo Bandini dessa vez, mas há ranço e rastro dele por tudo o que é parte de 1933 foi um ano ruim.
E, ler esse maldito, pra mim é um prazer que eu fico a adiar como a Clarice Lispector [outra escritora das fodas, que me faz sentir um misto de ódio e admiração a cada virada de página] descreve naquele conto, Felicidade Clandestina. Eu fico passeando com o livro pela casa, parando as minhas horas pra viver as dos personagens, rindo aquele riso irônico com metade da boca, pensando que não é possível que eu me veja refletida tão claramente em uma história que não é a minha.
Assusta e cativa na mesma medida. Vai direto ao ponto, mas de forma maldosamente branda pra que eu só veja o estrago depois de fechar o livro.

Diabo sô. O sujeito esfrega as minhas fraquezas na minha cara sem nem saber quem eu sou e eu ainda assim gosto dele. Coisa de doido, só pode.
Mas, então. Por via das dúvidas, devem haver uns perdidos atoas pedindo pra levar uns tapas na cara por aí.
Fecha essa janelinha escura então e vai atrás das coisas desse "Carcamano" que é todo contradição logo.
É muito mais negócio que tentar caçar algo que valha a pena por aqui. Sabe como, assunto anda faltando.

[Ouvindo Neil Young - Cortez The Killer]

quinta-feira, julho 21, 2005

[When you´re the only one] ou
(Hold me Close, I hate you the most II) ou
(Possível seqüência pro texto do dia 07 de Junho) ou
(Moon Song tem uma das letras mais simples e mais verdadeiras que eu já li, daí a razão que me faz usar alguns de seus trechos como pseudo-títulos de textos meus) ou
(Sem mais firulas, o mini texto ta aí embaixo.)


Ele tem uns olhos irônicos. As pupilas dilatadas o tempo todo, só deixam um contorno castanho avisando que estes não são olhos tão pretos como à primeira vista pode-se pensar. Pupilas engrandecidas como a de uma criança ingenuamente feliz, fazendo parte da janela de uma alma cansada, já traída pelo gosto amargo do pessimismo inato.
Olhos de criança em quem carrega espírito de velho.
Essa contradição toda me fascina, e então eu não consigo prestar atenção em outra coisa que não seja ele. Nessas mãos que sobem e descem sem saber onde exatamente parar. E no tap-tap-tap do pé denunciando sua ansiedade de garoto envelhecido antes da hora. Eu me perco no seu jeito de quem parece estar sempre à espera nervosa de um alguém que não chega, de quem tenta esconder seus defeitos atrás de uma cara fechada, de quem é só espinhos pra tudo o que possa chegar perto e dizer “oi.”
Sempre fugindo de mim, sempre estremecendo ao meu toque. Ás vezes me olha com raiva, ás vezes eu leio nos tais olhos certa admiração. Um dia eu vi amor. Mas já era tão tarde da noite e já estávamos tão bêbados. Preferi pensar que era um equívoco, surto pretensioso de garota convencida, e até hoje me embaraço nessa dúvida, enquanto mergulho meus olhos naqueles, tentando decifrar tudo aquilo que tenta com sangue e suor esconder, mas que eu desejo – mais que seu sangue e seu suor – descobrir.




[Internet voltou. Viajo sexta do mesmo jeito. Mas fico mais tranquila assim.]